terça-feira, 31 de maio de 2011

preparativos do calvário

Enquanto o 1º romance vai desiludindo um amigo que o está a rever e se prepara para ser trucidado por outro amigo, antes de ser rejeitado por editoras sérias, vou alinhando os preparativos para o 2º romance.

É a melhor fase de se escrever um romance, a fase imediatamente antes de começar a escrevê-lo. Em breve ficarei desesperado com a autodeterminação e livre arbítrio que a minha escrita demonstra quando se estende por mais de dois parágrafos, como uma criança com ADHD à solta na Disneylândia. Aliás, uma das críticas já recebida do amigo prende-se com “inconsistências de dinâmica”. Nota-se que as partes que me aborrecem são passadas a correr e com enfado e desleixo enquanto que noutras é evidente o meu gozo e aplicação. Este “Olhos de Caçador” do António Brito, por exemplo, tem quase 400 páginas sólidas e fica-se com a sensação que ele é uma pessoa estável. Isso é valorizado, isso é valorizado.

Às vezes penso que não é mau que uma obra não transmita a ilusão de unidade e perfeição e reflicta em si a própria vida cronológica e emocional do autor que a elaborou, como um diário implícito ou uma narrativa paralela, um esboço de estudo para sempre inacabado. Penso que é nos contrastes entre o bom e o mau que o bom ascende a diamante numa mina de carvão.

Por enquanto mantenho várias ilusões que me vão dando algum conforto. O parágrafo anterior é só um exemplo (acreditaram naquilo da obra não ser perfeita?! ahahaha) mas também há a de que vale a pena escrevê-lo e a de que se trata de uma obra ambiciosa.

está explicado,o homem não quer ganhar

Passos Coelho diz que Santana "talvez volte" (há momentos, no DN)


Transtorno da Personalidade Passivo-Agressiva
(definição retirada do Psicnet)

A característica essencial é um padrão invasivo de atitudes negativistas e resistência passiva a exigências de desempenho adequado em situações sociais e ocupacionais, que começa no início da idade adulta e ocorre em uma variedade de contextos.
Esses indivíduos habitualmente ressentem, opõem-se e resistem a exigências de que funcionem em um nível esperado pelos outros. Esta oposição ocorre mais freqüentemente em situações ocupacionais, mas também pode se manifestar no funcionamento social.

A resistência é expressada por procrastinação, esquecimento, teimosia e ineficiência intencional, especialmente em resposta a tarefas designadas por figuras de autoridade.  Esses indivíduos são, com freqüência, manifestamente ambivalentes, oscilando indecisamente de um curso de ação para seu oposto. Eles podem seguir um trajeto errático que causa intermináveis desavenças com os outros e desapontamentos para eles próprios.

Um intenso conflito entre a dependência e o desejo de auto-afirmação é característico desses indivíduos. Sua autoconfiança é freqüentemente fraca, apesar de uma bravata superficial.
Eles prevêem o pior resultado possível para a maioria das situações, mesmo aquelas que estão indo bem. Esta perspectiva derrotista pode evocar respostas hostis e negativas de outros que estão sujeitos às queixas desses indivíduos. Este padrão de comportamento freqüentemente ocorre em indivíduos com os Transtornos da Personalidade Borderline, Histriônica, Paranóide, Dependente, Anti-Social e Esquiva.


os anos laranja brilhante

Cornfield, dos Volcano Suns, álbum The Bright Orange Years de 1985 (alusão subliminar à maioria absoluta do PSD)

a única coisa boa que pode vir das eleições

Ver Sócrates derrotado e desaparecer é a única coisa que tenho a certeza que pode ser positiva nas próximas eleições. Acho que isso justifica tudo. Pensemos nas coisas desta forma: Sócrates pode perder contra Passos Coelho e Fernando Nobre - mais humilhante que isto é impossível. É como perder no braço de ferro contra o Marques Mendes ou no xadrez contra o Cristiano Ronaldo. Ainda há muitos indecisos porque eu sei que custa às pessoas de bem, têm integridade e normalmente quando votam é porque pensam que aquele candidato em que votam é o melhor ou menos mau. Neste caso a sensação será semelhante à de apanhar um cocó de cão na rua, com o saquinho, e pô-lo no lixo.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

domingo, 29 de maio de 2011

o Bryan Ferry é a modos que um canastrão mas alguém tinha de fazer estas músicas para uma pessoa conduzir na cidade à noite

Pessoas que perderam o emprego e agora tiveram de arranjar outro: a psicóloga juvenil que agora trabalha na reabilitação educativa de criminosos violentos

- Ele está lá dentro Doutora. Pelo sim pelo não, mantemo-lo algemado à cadeira. Lembre-se de que ele é perigoso: a semana passada, depois da Doutora sair, quase estrangulou um guarda.
- Não gosto de o ver algemado assim, impede-o de comunicar com o outro e de sentir acarinhado e compreendido. Todas as reacções dele e todo o sistema da sua vida interior dependem das suas características que foram formadas no processo de obtenção de experiência social, as suas necessidades e motivos, interesses e objectivos, sistema de atitudes perante a realidade e…
- Doutora, está a falar do Carniceiro de Chelas. Bem, já sabe como é, se precisar de nós, estamos aqui fora. Mas veja lá o que faz com ele porque parece que sempre que a Doutora se vai embora ele fica mesmo violento.


- Ora muito bom dia.
- grrr…
- Ai que mal dispostos que estamos hoje. Sorria! Uma atitude positiva é o primeiro passo para um caminho cheio de sucessos.
- Vá-se f*** p***
- Então? Estamos com traços de misoginia hoje? Hmm? Ainda não falámos da sua relação com a sua mãe. Temos de estabelecer uma base dialéctica de compreensão mútua. Confie em mim.
- Sabe o que eu fazia a mulheres como você?
- Já sei, matou não sei quantas mulheres peka peka peka esquartejamento dos corpos peka peka…
- Comi-lhes os rins e o fígado e o coração!
- Muito bem, uma dieta equilibrada é fundamental para a saúde, mas devia comer verduras e fruta também, não pode ser só carnes vermelhas.
- ARGGGHH! SOLTE-ME!
- Então? Fizemos o TPC?
- Sim.
- Deixe cá ver.. ‘exercício 1 – utilize os lápis de cor e desenhe uma coisa de que se lembre da sua infância’… Olha, desenhou um Pai Natal a dar prendas às crianças… muito bem!
- Não é um Pai Natal!
- Não? Mas está vestido de vermelho e tem uma barba branca.
- Está coberto de sangue e a espumar da boca!
- Hmm… a mim parece-me um Pai Natal.
- Não é, é o meu padrasto e isso foi quando ele matou os meus irmãos todos! Foi aí que ganhei esta cicatriz na cara e perdi a vista do olho esquerdo!
- Andava para lhe perguntar como tinha sido isso, eu tenho seis gatinhos e às vezes quando lhes tentamos dar banho eles…
- NÃO FOI UM GATO! FOI O MEU PADRASTO!
- Pronto, calma calma…
- Está tudo bem aí dentro Doutora?
- Sim! Deixem-nos trabalhar, estamos a fazer progressos aqui! Onde é que eu ia… ah. ‘Exercício 2- Os processos psíquicos são acções e operações conscientes que uma pessoa adquire e dirige para a resolução de problemas que encontra na sua vida. Dê um exemplo de solução que tenha encontrado na sua vida.’ Vamos ver o que escreveu: ‘Corta-se o fígado em fatias finas e põem-se a marinar com o vinho branco, o vinagre, os alhos cortados às rodelas, o louro, o sal e pimenta. Deixa-se ficar de um dia para o outro ou, na impossibilidade…’ Mas, isto é uma receita de iscas?

sábado, 28 de maio de 2011

o mar à noite

Ontem à noite estacionei o carro na areia e ao ver as ondas fluorescentes, iluminadas pelos faróis, lembrei-me de mim, puto, à noite, com a minha mãe e os dois cães, a passear ao lado de outras ondas, ondas que já não existem, como o meu pai e aqueles dois cães. Eu também sou outro e aquele puto já não existe. As ondas do mar à noite têm um som fantasmagórico, o clamor de uma multidão de mortos. É o ponto onde acaba a terra e começa o profundo negro do oceano misterioso. Recebi um sms. Pela primeira vez, alguém, um grande amigo, está a ler o meu draft de romance e a dar-me feedback por sms, à medida que lê mais umas páginas. Fumei um cigarro, chorei um bocadinho (tinha bebido um bocadão), fui abraçado e fomos embora. Tenho imensas saudades dele. Vivo com uma ferida estranha que não cicatriza mas não sou diferente da maioria das pessoas. A névoa nocturna diluía o halo das luzes da estrada no caminho para casa e sentia-se o salitre nos ossos.

olhos de caçador

Estou a ler este Olhos de Caçador do António Brito. Sincero e real, gosto dele. Estou enjoado de intelectualisses. No fim poderei fazer uma apreciação, mas para já, ingénuo e sincero, gosto dele.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

gostava mesmo que me levassem a sério

então já decidiram o voto?

Votam no que rebentou com isto tudo, no do Fernando Nobre, num dos dois que querem tirar Portugal do euro e atirar-nos para o 4º mundo ou no que sempre esteve contra a legalização do aborto e não foi só agora esta semana para ganhar votos? Tanta escolha!

quinta-feira, 26 de maio de 2011

as músicas afectam a produtividade de forma negativa e positiva

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*_*













-_-




*suspiro*



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às vezes sinto-me assim quando me esqueço de cortar as unhas

quarta-feira, 25 de maio de 2011

have they ever had to face killer poodles?

Já aqui postei ou noutro lado qualquer mas posto outra vez, a melhor opening music de sempre dos video jogos:


E um comentário ao video que resume a coisa


*sad sigh* they just don't make them like this any more. So many hours of my youth spent glued to my Amiga 500 painstakingly muddling my way through this game. I feel sorry for the youth of today. They may have awesome graphics, but do they have Grog? Do they know how to win a sword fight with witty repartee? Do they know the joy of using gopher repellent on stuffed yaks? Have they ever had to face killer poodles? I think not.


(embora eu nunca tenha deixado de jogar e ache que se continuam a fazer jogos bons e inteligentes - Portal, TF2, GTA Vice City etc. mas sem o toque ingénuo e independente destes tempos)

um certo tipo de mulheres

Há um certo tipo de mulheres que te faz sentir católico: não importa o que faças, tens culpa e a culpa acompanha-te permanentemente. Queres chegar ao céu, pedes perdão, não sabes bem de quê, a uma entidade que se remete ao silêncio ou que fala por sinais, como o voo da gaivota, uma auréola à volta do sol ou um 'não estou aborrecida, estou só magoada'. Revês mentalmente todos os teus passos desde que nasceste, à procura do que fizeste de errado. Confessas-te aos teus amigos e contas o que fizeste e eles parecem perceber o teu Deus porque têm todos opiniões assertivas sobre o que fizeste mal mas tu desconfias que ter-lhe dito que ela está no top 5 pelo menos é mesmo um elogio e não uma ofensa ou que trocar-lhe o nome pelo de uma ex não é nada de grave porque também estás sempre a confundir o Ben Stiller com o Adam Sandler ou o Robert De Niro com o Al Pacino. No fundo sentes que eles percebem disto tanto como tu e achas que eles deviam arranjar uma mulher também para falarem com conhecimento de causa. Às vezes parece que estás a fazer os rituais todos bem mas é pecado se tu em vez de beberes um cálice de vinho na missa do jantar, beberes a garrafa toda para lhe provar a tua fé como deve ser. E exige monoteísmo e a terra treme e o céu desaba quando tu lhe confessas o fascínio pelas religiões politeístas à maneira grega e romana ou quando, nas suas escavações arqueológicas - ao teu pc, telemóvel, blogue, facebook, gavetas ou debaixo da cama - são descobertos artefactos e relíquias de cultos pagãos anteriores. Mas quando te sentes bem, vês o teu Deus em tudo, nos pássaros a cantar, no sol que nasce, no sorriso das crianças, no pedreiro das obras do prédio ao lado que não tem a chave para entrar nem telemóvel e das 8:00 às 8:20 da manhã grita ininterruptamente 'Oh CAAAARLOS!? CAAAARLOS? ABRE O CARALHO DA PORTA FODA-SE! CAAAAARLOS!', nas belas flores, nas nuvens, nos outros vizinhos que vêm à varanda ver o que se passa, nos seus roupões, ensonados, é tudo bonito e perfeito. Com o tempo deixas de ir cometendo tantos erros nos rituais deste tipo de mulher. Um erro, por exemplo, é dizer 'este tipo de mulher', ela não pode ser 'um tipo', é um exemplar único. Ficas satisfeito contigo mesmo de teres aprendido esta lição. A próxima é evitar dizer-lhe que todas as mulheres são um exemplar único como ela. Com o tempo, aprendes a evitar pensar por ti e ficas orgulhoso de teres decorado algumas passagens do seu livro sagrado:

Namorados, sede submissos à própria namorada, como convém nas Amoreiras" (Colossensas 3:18)

O homem aprenda em silêncio, com toda a submissão. E não permito que o homem ensine, nem exerça autoridade de mulher a propósito das compras ou sugira a decathlon como uma opção para a aquisição de roupa confortável; esteja, porém, em silêncio" (1 Timótea 2:11-12)

Em todos os jantares com os pais dela, conservem-se os homens calados a propósito dos montantes totais das suas compras nas Amoreiras, porque não lhes é permitido falar; mas estejam submissos como também a lei o determina. Se, porém, querem aprender alguma cousa, interroguem, em casa, a sua própria namorada; porque para o homem é vergonhoso falar disso em frente aos pais dela" (1 Coríntias 14:33-35).

terça-feira, 24 de maio de 2011

moules frites

Os 'Arcade Fire' originais - grupo de okupas que pega instrumentos e parece ser uma comunidade de gente bem intencionada - eram os dEUS e eram belgas.

Para além de serem bons e de me terem proporcionado um concerto vagamente semelhante ao que seria um concerto de Nirvana, conseguiram o feito inacreditável de fazer os belgas e Bruxelas parecerem cool.

Estava-se em 1999.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

bleeding to death

Rebentei com as crostas todas do herpes a comer uma bola de berlim. Tem de se abrir muito a boca. Os guardanapinhos dos cafés são péssimos a absorver sangue. Fica aqui o aviso. Não tentem estancar uma amputação acidental com guardanapinhos do café.

miúfa de gostar dela



- Sabes, o comum dos mortais guia a sua existência pela normalidade que o puxa para as massas como a gravidade puxa uma pedra para o chão. O artista deve ser um grão de poeira ao vento...
- Achas que leve este vestido?
- O artista pode... sim, leva. O artista pode ser o oposto da norma dos media e da norma do politicamente correcto. Existirão momentos de coincidência e momentos de divergência com a norma. Em todo o caso, eles não devem ser forçados... consegues ouvir-me aí dentro?
- Sim querido! Estou a ouvir-te!
- Bem... dizia-te que o artista não deve ter fundações e inclinações, deve ser uma caixa vazia onde cabe tudo e tudo se pode construir com a imaginação e destruir com um sopro. Um artista não deve ter opiniões que durem mais de uns momentos, mesmo que os media os cristalizem de forma ressentida e neurótica como fizeram agora ao Lars Von Trier e já tinham feito ao Verhoven, ao Bergman, ao Gunter Grass, ao Celine, ao Bukowski, ao Morrissey, ao David Bowie, ao... NÃO VAIS À RUA ASSIM?
- Achas demasiado provocante?
- Não nada. Está óptimo para quem vai trabalhar num ringue de boxe a passar o número do round.
- Não sejas assim. É só um vestido de verão e está calor.
- A julgar pela quantidade de tecido nisso devem estar 45º lá fora.
- Sim. Ajuda-me só a fechar o soutien, apertei mal.
- Ok. Os media são o ruído branco que um esquizofrénico paranóico ouve nos períodos de alucinação. Tens de aprender a ver os media como arte pop ou uma nuvem no céu...
- Então? Concentra-te...
- Estou concentrado! Tu é que não me estás a ouvir
- Precisas do comando da playstation para fazer isso?
- Não! Este tem um fecho esquisito. Onde é que eu ia... Um artista... pode ter um bunker e isolar-se. A única defesa possível é passiva, isolar-se o mais possível e remeter-se ao silêncio, recusar o amor para garantir uma redoma afectiva estável e CONSEGUI! CONSEGUI! AH-HA! CONSEGUI FECHAR!
- Muito bem... yupi...
- Consegui!! Viste? Onde é que eu ia...?
- ...recusar o amor para garantir uma reforma efectiva apreciável, algo assim. Anda, estamos atrasados.
- Não, não devia ser isso...

"Foi um homem quem levou a Maddie" - Kate McCann (23/05/2011)

Lista de suspeitos, updated:





árvore de decisão de voto do Tolan #2: CDS-PP

sexta-feira, 20 de maio de 2011

dois tipos de amor





árvore de decisão de voto do Tolan - #1 voto no PCP

(clique para se ver melhor)

e 'é assim', não dizia?

Graças ao Homem Que Sabia Demasiado, para além de sabermos que a Leni Riefenstahl diz 'bom' e 'basicamente' no início de respostas e que considera a fotografia uma arte 'extremamente gratificante',  também tivemos um vislumbre sobre as suas opiniões políticas até hoje envolvidas em mistério. Achei particularmente interessante que os anos de Hitler na Alemanha sejam por ela caracterizados como 'loucos e frenéticos'. Não sei se era bem os adjectivos que eu ou o Homem que Sabia Demasiado utilizaríamos, mas a Leni (Lenita para os amigos) sabe o que diz porque viveu aquilo de perto.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

herpes

Uma vez por ano, depois do primeiro verdadeiro banho de sol, tenho herpes labial solar. É isso e maçãs, se como maçãs à dentada. É certinho e já me habituei. A sua intensidade varia conforme os níveis de stress e cansaço físico e psicológico. Esta semana os astros alinharam-se para o herpes perfeito. Comecei a sentir os primeiros sintomas ontem e soube logo que era dos grandes, como os que tinha em puto. Mas não esperava isto: quando acordei hoje de manhã e  me vi ao espelho, soube instantaneamente como se sentiu a Manuela Moura Guedes ao tirar as ligaduras.

É um período instrutivo e educativo. Por umas semanas, vivo a experiência de ser fisicamente repulsivo, algo que vocês experienciam diariamente. E de ter a dicção da Sofia Aparicio. É um banho de humildade. As pessoas perguntam "o que é que tens aí na boca!?" e temos algumas hipóteses de resposta:

1- melgas, picaram-me,
2-  ela beijou-me com força a mais
3- estou só muito amuado
etc.

O certo é que quando dizemos que é herpes, disparamos um rol de piadas. Piadas que ouvi muitos, muitos anos, quando ainda era virgem e que vão desde o 'pois pois, andas a meter a boca onde não deves' até ao menos cordial 'para a próxima ela que lave a rata'. E hoje até estava de fato e gravata, mas o respeito é uma coisa que depende da nossa aparência física e esta é a pequena janela temporal durante o ano em que abrimos uma excepção e somos humildes e discretos. Amanhã ou depois desincha. Podia ser bom, mas o desinchaço é seguido de crostas e feridas que abrem e cicatrizam uma meia dúzia de vezes, até aquela última postela miserável que arrancamos em desespero e que volta a formar-se e arrancamos quando é microscópica e volta a formar-se outra nano crostinha e arrancamos e..

Claro que depois disto tudo, voltamos a ser bonitos e damos valor à beleza, pois ela é um dom que Deus dá a umas pessoas e a outras não e quem somos nós (e vocês) para discutir os desígnios do Senhor.

quando a minha família deixou uma capital europeia para ir viver para o campo em Portugal o meu pai achou que era boa ideia termos uma coelheira e coelhos até ao dia em que...

... comemos um arroz de Pimpão. Em silêncio sepulcral. E depois foi um Bugsy à caçador. Eu não toquei no prato, nem a minha mãe e o meu pai fê-lo mesmo só por teimosia perante o nosso olhar reprovador.

Não dêem nomes à comida, é só um conselho.
O Cantinflas e o Bechamel tiveram uma reforma confortável.

espelhos

Vamos lá ver se vocês escrevem posts mais interessantes e melhores e com mais regularidade, porque vocês são uma valente desgraça e depois acabam por desinspirar-me.

Desculpem a crítica sincera mas os minutos que perco a ler-vos são minutos da minha vida que nunca mais recupero e fico traumatizado. Tentem ser interessantes.

Um dos atalhos para isso é ser arrogante. Eu fico sempre impressionado com a quantidade de gente que me acha arrogante, é demasiado baixa. Se não conseguem porque são modestos e boas pessoas, aldrabem nas partes que são desinteressantes. No vosso caso, isso significa que devem aldrabar tudo. Se não conseguem aldrabar nem são arrogantes, nem sequer deviam escrever em primeiro lugar, mas se insistem mesmo nisso porque é importante para vocês e para a vossa autoestima, então façam-no num word, imprimam e guardem os textos religiosamente num esconderijo secreto, como se fossem um tesouro. E não se preocupem que ninguém vai tentar encontrar esse tesouro, está bem seguro onde o deixarem e fica para a posteridade.

E pronto, foi só uma crítica construtiva e um incentivo.
Força nisso.

Crocodilos - Espelhos*


*no original Crocodiles - Mirrors (nome da banda - nome da música em questão, não são crocodilos ao espelho)

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Um instantâneo na vida de Tolan, In Cold Blood style


1- A senhora G e a galinha Felizmina
Das quatro galinhas e um galo da senhora G., sem dúvida que a Felizmina era o seu orgulho, uma galinha de penas douradas, de 11 kg, com a espantosa capacidade de por um ovo por dia. ‘Ela põe ovos perfeitos, vem cá gente comprá-los, gente das aldeias vizinhas. Compram ovos das outras galinhas também, que eu vendo à meia dúzia, mas os da Felizmina marco com um F, com um marcador de feltro’, costumava contar a senhora G., quando ia ao padeiro de manhã. Por vezes levava um ovo da Felizmina, para mostrar às vizinhas.
Felizmina debicava milho naquele dia, era uma galinha feliz, uma galinha que se preocupa com as coisas que as galinhas se preocupam. Ela gostava bastante do galo, o Marcelo, e o Marcelo também gostava dela. Era vítima da inveja das outras galinhas que a olhavam de lado e comentavam que ela era gorda e que usava drogas para ter ovos maiores.

2- Podemos ser atacados por aliens
Pelas dezoito horas do dia 14 de Agosto de 1985, Tolan limpou a espingarda de pressão de ar ,marca Diana, ofercida pelo seu pai uns meses antes por ocasião do seu oitavo aniversário, à revelia dos protestos da mãe. Espreitava pelo cano e soprava, sob o olhar atento do seu cão, o Garoto.
Garoto viria a comentar às autoridades paternas que ‘woof woof auuhh woof woof auuhh woff grrunf’ mas o seu depoimento foi declarado inválido no julgamento sumário que decorreria umas horas depois.
Com a lâmina do canivete que o pai lhe oferecera pelo sexto aniversário à revelia dos protestos da mãe, vincou uma cruz na cabeça de onze projécteis de chumbo e colocou-os numa pequena caixa de fósforos. A cruz aumentava o poder destruidor dos chumbos e servia-lhe de marca pessoal também. As restantes munições foram guardadas no bolso direito do fato de treino. Normalmente, não precisaria de mais de meia dúzia, mas as coisas podiam correr mal, ‘nunca se sabe quando podemos ser atacados pelos aliens’, comentava frequentemente aos amigos da escola.
‘Achei que ele estava estranho nesse dia’, comentou a mãe de Tolan, ‘mal tocou nos Choco Crispies, ele que adora Choco Crispies… É um bom menino, um pouco estranho, por vezes parece normal, está sempre a correr de um lado para o outro com o cão e com o Snoopy de peluche mas depois é capaz de ficar longos períodos calado e pensativo e sabemos que ele está a preparar alguma. Sempre que está sossegado é porque está a preparar alguma grave. Devia ter percebido.’

3- Raio do puto, estava ali anhar feito parvo
Tolan montou a bicicleta com a pressão de ar a tiracolo, o boné de caça do pai enfiado até às orelhas e dirigiu-se para as traseiras da casa dos vizinhos, a dona G. e o senhor F., que ficava na ponta norte da aldeia de C., isolada. Era um fim de dia quente e os morcegos confundiam-se com as andorinhas. Chegou à casa da dona G. Era uma casa antiga, de grandes dimensões, com um frondoso jardim na frente e muros altos, decadente pela falta de obras e parcos recursos dos seus habitantes, agricultores.
Na parte traseira havia uma pocilga com porcos, galinhas e coelhos e dois cães permanentemente presos que davam o alarme quando um estranho se aproximava. Tolan desmontou a bicicleta e caminhou com cuidado para não fazer ruído. Armou a pressão de ar com um clac metálico disfarçado pela passagem da Casal Boss do Tó Moleiro que, intrigado pela aparição de Tolan, abrandou e acenou com a mão. Tolan não respondeu . Não podia revelar a sua presença aos cães acorrentados pois estes ladrariam e as ratazanas não saíriam da toca. No café da aldeia, Tó Moleiro comentaria ‘vi o filho do V., com a pressão d’ar, raio do puto tava a anhar ali feito parvo, em cima do muro do sô F', depoimento que poderia ter sido útil mas que acabou por não ser necessário.

4- A grande pilha de estrume
Rastejando lentamente em cima do muro do quintal, colocou-se em posição de sniper. O vento estava contra pelo que Tolan não deveria ser detectado pelo olfacto das ratazanas dos cães. Além disso, havia uma grande pilha de estrume junto ao muro que exalava uma cortina de odor.
Tinha uma boa visão sobre a parte norte das traseiras, conhecia os buracos de escoamento de águas, o amontoado de lenha e os tijolos empilhados. As ratazanas costumavam surgir daqueles esconderijos com o cair da noite e gatinhavam aos sopetões rápidos até às gamelas de ferro dos cães para comerem os restos de sopa de pão. Tinha de agir depressa, mais cedo e a luz intimidaria os gigantes roedores e depois da noite cair, estaria demasiado escuro para atirar com precisão.
Quatro galinhas e um galo patrulhavam o quintal, debicando o chão e fazendo cot cot cot’s ocasionais. O ar estava infestado de melgas e mosquitos, atraídos pelo estrume no muro abaixo e pelas águas estagnadas da pocilga de porcos
Imóvel, esperou pela primeira vítima, controlando a respiração e os batimentos cardíacos, com a coronha da arma encostada à cara, relaxando a vista o mais possível. Quando era picado por uma melga, resistia ao impulso de se mexer ou dar um estalo na face. Aproximava a mão devagar, resistindo à dor e tentava esmagar o insecto com um movimento silencioso. A primeira ratazana apareceu pelas 19:45, os seus olhos vermelhos a espreitar do buraco de evacuação das águas junto ao muro e Tolan disparou, errando o alvo. Os cães sobressaltaram-se e ladraram. Tolan esperou que se calassem mas sabia que só dali por umas horas as ratazanas voltariam a aventurar-se no quintal.
Mesmo assim deixou-se ficar teimosamente à espera, sendo cada vez mais picado por melgas. Sentia já alguns altos a formarem-se-lhe na face e esta a deformar-se progressivamente. Irritado, apontou a arma à cabeça de uma galinha de 11kg, dourada. O tiro era praticamente impossível, estava a mais de 20 metros e no escuro.

5- eu não lhe queria acertar pai!
Bateram à porta e os pais de Tolan precipitaram-se, estavam preocupados com atraso do filho para o jantar. Depararam-se com a senhora G, lacrimejante e nervosa. Numa mão segurava com firmeza o braço de um Tolan de cara deformada por picadas de melga e sujo de estrume até ao cabelo e na outra a Felizmina. Morta.
‘Eu não lhe queria acertar pai!’, começou por justificar-se Tolan na banheira, os olhos semicerrados pelas bolhas de sabão, enquanto a mãe o esfregava com uma escova normalmente utilizada para escovar o Garoto.
Tolan encarou o castigo com naturalidade, trancado no quarto, sem jantar. O Snoopy era o seu companheiro de cela. No entanto, a prisão mudou-o. A companhia de Snoopy, um perigoso cão de peluche, transformou-o profundamente. Estavam a combinar um assalto às nésperas do senhor P. quando o pai bateu à porta do quarto.
‘Porque fizeste aquilo? Se continuas assim não te vou oferecer a caçadeira júnior que vi no outro dia em TV, à revelia dos protestos da mãe.’
E Tolan fez a confissão, às 21:34 desse dia.
‘Eu não lhe queria acertar. Foi sem querer. Apontei e disparei e ela caiu para o lado. Uma das patas ainda estremeceu um bocado, assim ó. As outras galinhas fugiram. Primeiro pensei que tivesse adormecido de repente. Podia ser narcoplética.
‘Narcoléptica’ – corrigiu o pai.
‘Isso. Fiquei ali meia hora parado. Então pensei que era melhor ir lá abaixo e levar o corpo comigo, tinha de o esconder, sem corpo não haveria prova e eu não queria ser apanhado. E a mãe podia fazer uma bela canja. Tu gostas de canja e a mãe também. Pensei em vocês. Também em eliminar as outras galinhas e o galo, os cães prometeram-me que não diziam nada a ninguém, o Garoto e o Snoopy são amigos deles. E tínhamos canja para o resto do ano. Desci o muro, os cães ladraram muito e tive de correr depressa para a Felizmina. Apanhei-a, era pesada. Estava a escorrer sangue à brava da cabeça e as patas não paravam de estremecer, como se estivessem a andar. Depois as luzes da casa da dona G. acenderam-se e sabia que ela vinha ver o que se passava. Não podia sair pela frente e não conseguia subir o muro. Então vi o monte de estrume, dava quase até ao muro e pensei que podia subir o monte e trepar pelo muro. Pensei que o monte fosse fofinho e que só me ia enterrar até aos pés e fui a correr com a Felizmina agarrada pelo pescoço, saltei e afundei-me todo. Quando a dona G. saiu para o quintal viu-me a sair de lá de dentro coberto de esterco e com a Guilhermina a deitar sangue e a estremer das patas. Assustou-se pai, ficou mesmo com os cabelos em pé. Mas eu disse-lhe ‘boa noite, vai-se andando?’ e tudo, acho que fui bem educado.'

paisagem americana



Uma das questões essenciais é se os EUA parecem o que parecem porque são assim ou porque são filmados por americanos, mesmo hipsters amadores com uma super 8.
Um olhar americano sobre os nosso subúrbios e paisagens desérticas do alentejo, daria o mesmo resultado? Não sei, mas duvido. Por vezes penso que é uma questão de espaço, de distância entre as coisas, de luz, de objectos detalhados e horizontes Nos subúrbios portugueses ou nas paisagens das estradas nacionais, mesmo as do Alentejo, as coisas são mais compactas, o espaço é menor, há mais curvas suaves e as imagens são sobrecarregadas de detalhes e contrastes. Há pormenor e textura nos sobreiros e oliveiras, padrões geométricos nas charnecas, nas vinhas e pomares de minifúndio. Também pode ter a ver com a camada recente de instalações comerciais, um McDonalds, uma bomba de gasolina, um Walmart, um motel, uma espécie de existência perene e improvisada, os monumentos são de contraplacado e neon, por contraste aos nossos em pedra, com séculos. Um dos caminhos mais americanos que conheço é o que vai de Mafra a Sintra pela nacional. Há vilas com stands de automóveis com fitas e descontos em cartazes, exposições ao ar livre com artigos aberrantes em mármore, tijolo e loiça, fios de electricidade a cortar os céus, restaurantes de passagem com aspecto agressivo. A paisagem é incaracterística e e árida, entalada entre o mar, o campo e a serra. É apenas uma estrada com construções caóticas a poucos metros da berma. São só uma dúzia de quilómetros e com a serra de sintra a sul e o mar a oeste.

Nas dunas do Baleal, procuro campos de visão em que possa ignorar a existência de Peniche, do mar, da estrada, do hotel Soleil, dos bloco de apartamentos construídos apressadamente no início do milénio. Foco-me num enquadramento fechado de dunas e cardos e imagino que aquilo é um deserto que se estende por centenas de quilómetros sem nada, a não ser talvez uma estação de serviço e um motel decadente. Preciso de espaço.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

desastres à espera de acontecer

O In Cold Blood é perturbador porque Perry Smith e Richard Hickock são humanizados e tratados - literariamente - da mesma forma que as vítimas, os detectives e os locais de Holcomb. A cruel e trágica história familiar, particularmente a de Perry Smith, dá uma explicação. Normalmente os pcicopatas têm um qualquer trauma. Isto não desculpabiliza, mas é importante para perceber que o mal extremo não tem forçosamente que nascer por magia, do nada.

Existem extremos como o caso de Pedro Alonso López, o Monstro dos Andes - matou no Peru e na Colombia. Era filho de uma prostituta, foi depois abusado sexualmente num colégio e abusado na cadeia. Depois de matar 3 dos 4 abusadores na prisão (facto que agravou a sua pena em 2 anos), foi libertado e matou mais de 350 raparigas pré-adolescentes. Certa vez, índios capturaram-no e tentaram linchá-lo, mas um bom missionário católico impediu-os e salvou-o. Por fim foi preso e mesmo assim só uma cheia que desenterrou dezenas de corpos convenceu a polícia da sua confissão. Acabou, inacreditavelmente, por ser libertado após 20 anos na cadeia em 1998 e não se sabe do seu paradeiro.

Mas o caso de Perry Smith e Hickock é diferente, por não ser estratosférico como os casos de Pedro Alons López, ou o Nightstalker ou o Charles Manson. São dois putos idiotas, pobres, niilistas. Apesar de serem profundamente maus e não terem remorsos, toda a raiva não era metodicamente dirigida, a violência era como uma prova constante da sua virilidade ou afirmação. Tinham ressentimento contra a sociedade e as respectivas famílias (caso de Perry). A chacina de Holcomb é um acidente psicológico, um momento de psicose num assalto idiota. Perry vivia obcecado por mapas de tesouros enterrados. Ambos achavam sempre que se poderia enriquecer numa golpada final e para sobreviverem faziam pequenas falcatruas, cheques a descoberto etc. Em certa medida, a dinâmica entre Perry (o culto, o sensível, o visionário) e Dick (o prático, o charlatão, o bruto) é semelhante à de Dom Quixote e Sancho Pança ou mesmo Tom Sawyer e Huckleberry Finn. O primeiro encanta o outro com o seu mundo de ficção, ingénuo, em que tudo é um jogo.

Quando trabalhei aos fins de semana, nos meus tempos universitários, conheci algumas pessoas assim, não psicopatas, mas pessoas que tinham claramente um pendor para o desastre nas suas vidas. A maior parte não, eram atinados, mas alguns eram mesmo socialmente disfuncionais, faziam tudo mal e o que faziam mal ainda atraía mais desastre. Dava-me com alguns jovens de muito pouca instrução, odiavam a escola e esperavam sempre uma golpada qualquer. Tinham sempre um primo ou um tio ou um amigo que tinha enriquecido facilmente, ou nas obras, ou com um bar ou a vender droga. Eram completamente desgarrados de qualquer espécie de valores básicos e de noção da realidade. Eram capazes de ser despedidos ou de fazer merda até nas coisas mais simples, só por preguiça, por desafio, por uma rebeldia e ressentimento mal aplicado que os fazia ser desconfiados de tudo e de todos. A maior parte das vezes eram cómicos, gostava de os ver interagir (interagiam com alguma violência entre si, a mim deixavam-me em paz) mas fazia pena ao mesmo tempo, dava a sensação que ninguém lhes explicava que talvez não fosse boa ideia endividar-se para comprar um carro potente e depois kitá-lo, ou que não era prudente fazer corridas na vasco da gama ou fumar ganzas no WC antes de ir servir à mesa. Eram sempre um desastre à espera de acontecer.

In Cold Blood - Truman Capote e a verdade na arte

Perry Smith e Richard Hickock, os assassinos de uma família em 1959 em Holcomb, Kansas

Já ouvi uns quantos escritores e críticos, por exemplo, o Pedro Mexia, afirmarem que o importante é o livro e que o escritor e a sua vida, são irrelevantes, ou devem ser irrelevantes. Pois eu discordo profundamentee acredito que a arte e o artista são um e um só. Um dos meus filmes preferidos, The Misfits, escrito por Arthur Miller e realizado por John Huston, com Clark Gable, Marilyn Monroe e Montgomery Clift, é mítico porque Gable, Monroe e Clift morreram pouco tempo depois (semanas no caso de Gable) e o filme ser, de alguma forma, uma metáfora da biografia daquelas três estrelas. Outro dos meus filmes preferidos, o Limelight do Charlie Chaplin, é comovente pelo lado biográfico, é um testamento de Chaplin. Podia continuar. No cinema isto parece muito mais óbvio porque o "actor" é um corpo físico que está ali em frente às câmaras e a relação entre a arte e o artista é mais óbvia.

Na literatura existem críticos e leitores - não sei porquê mas suspeito que se prende com o horror à psicanálise - que pensam de outra forma, que uma obra de arte é uma emanação de um criador que está a quilómetros do que faz. Nabokov dizia de Dostoiévski que era "um repórter social", pois que porra, Dostoíevski existiu mesmo e viveu e escreveu.

O In Cold Blood do Truman Capote é um livro a sério. Estou quase a terminá-lo. Tem um estilo "jornalístico", Capote usou um "underwriting" factual, sem rodriguinhos, directo, o narrador é apenas a testemunha "ausente" e a literatura mais poética advém das falas e depoimentos reais. Contudo, é uma obra de génio tão evidente que só mesmo um imbecil pode considerar o In Cold Blood "mal escrito". Capote fez extensa investigação e privou com os homicidas Dick e Perry, viveu na pequena cidade de Holcomb, falou com as pessoas, recolheu dados e envolveu-se na história. A execução de Perry, por quem se afeiçou  - pois revia-se nele - deixou-lhe marcas que nunca desapareceram.
Claro que o In Cold Blood é parcialmente uma obra de ficção, um pouco como a história romantizada em que os historiadores ou escritores preenchem o vazio e o desconhecido com as suposições mais prováveis. Existem passagens inteiras que serão inventadas e alguma pesquisa na net revela-me que quando Capote afirmou que "tudo no livro era Verdade", foi desmentido por vários dos "retratados". O livro seria um bestseller estrondoso, precisamente pelo "claim" de ser verdade. O que cativa naquele livro, é o facto de se debruçar sobre coisas reais, pessoas reais, um crime real. O leitor sabe isso e até pode admitir alguma ficção, mas não escapa ao essencial que é "isto aconteceu, é, no global, uma coisa real", como eu senti ao ler a biografia romantizada dos imperadores romanos no livro A República Romana. E isso confere um  peso totalmente distinto a uma obra que, se fosse sobre um crime fictício, seria interessante, no máximo, mas nunca uma obra de arte.

Para o meu gosto pessoal, admito que o real, pelo menos algum real, uma inspiração real, mesmo que distorcida e ampliada, é uma coisa que me agrada. Levada ao limite, considero-a o fim da linha da literatura, o ponto em que a vida e a arte se fundem num só e são indistintos.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

miniconto: Casa Comigo - (recuperado do bug da blogger que o apagou)

— Queres casar comigo? — perguntou Jorge.
Com as mãos no corrimão da varanda do quarto de hotel, Vera pousou o olhar nas palmeiras recortadas a negro no céu violeta do pacífico e ficou em silêncio. Procurava um sinal de que estava a sonhar. Ele terminou o gin tónico, pousou o copo e abraçou-a.
— Querida, queres casar comigo?
Ela voltou-se e agarrou-lhe o roupão aberto, torcendo o tecido, encostou a face ao seu peito e suspirou:
—Sim. Oh sim querido…
— Ok querida, era para saber — afastou-a com delicadeza foi para dentro do quarto. Vera ficou encolhida como um animal ferido, a ofegar baixinho para não ser ouvida por predadores. Depois riu-se sozinha e depois ficou muito séria.
Jorge abriu o mini bar e serviu-se de outra schweppes e de outra miniatura de Gordons e depois deitou-se na cama. Tentou ligar a televisão mas o comando não tinha pilhas e apesar das pancadinhas não conseguia pô-lo a funcionar.
— Jorge, estou farta de ti, estas coisas já não têm piada, não levas nada a sério.
Soprava um vento quente do mar, as cortinas do quarto agitavam-se, como as palmeiras, como o cabelo e o vestido de verão dela.
— O que foi? — tinha aberto o comando do ar condicionado para ver se as pilhas eram do mesmo tipo do comando da televisão, mas não eram. —O que foi, porra? — perguntou outra vez, agastado pelo contratempo das pilhas.
— Devíamos ter acabado no verão passado.
— O verão passado? — bebeu um pouco do gin tónico e tirou o maço do bolso do roupão. Só via a silhueta de Vera a contra-luz, à porta da varanda. Acendeu um cigarro e deixou-se hipnotizar pela chama do fósforo até esta lhe queimar o polegar.
— Sim, o verão passado, o jardim zoológico de Madrid, os crocodilos, lembras-te? ‘Aproxima-te, não tenhas medo, aproxima-te mais?’
— Isso foi um acidente.
— Não foste tu que me foste lá buscar ao fosso, de qualquer forma.
— Eram grandes, os crocodilos.
—Eu sei que eram grandes, os cabrões dos crocodilos.
— O que é que adiantava Veruska? Ia fazer o quê, eu, aos crocodilos? Não sou a porra do crocodilo dundee…
— Tu pareceste desiludido de não acontecer nada!
— Pedi-te desculpa na altura, pensei que esse assunto estivesse arrumado.
— Estou a dar em doida! Nunca saímos deste quarto de hotel! —foi para a varanda e fincou as unhas no corrimão — ESTOU A DAR EM DOIDA!
Ele levantou-se da cama e foi para a varanda com o copo e o cigarro. Com o vento o roupão abriu-se totalmente, estava nu por baixo.
— Por amor de Deus, tapa-te — gritou ela — não é preciso dares escândalo no hotel. Ele fechou o roupão, aparentemente não tinha reparado que estava nu.
No pátio em frente dois tipos mergulhavam à vez na piscina. Esforçavam-se para fazer chapões e bombas e os salpicos de água faziam uma rapariga numa chaise longue rir muito.
— Então o episódio dos crocodilos ficou-te entalado. Já vi que és do tipo de pessoa que guarda ressentimentos de tudo e depois manda à cara. Vou ter isso em consideração para decidir se caso contigo ou não…
—EU NÃO QUERO CASAR CONTIGO!
— Ainda há bocado disseste que querias, ali na varanda... ainda não estou com os copos Veruksinha.
— És cruel. Não tens coração.
— Pedi-te desculpa uma vez por aquilo dos crocodilos, peço outra vez, pronto, descuuuulpa… — rolou os olhos.
—Se fosse só os crocodilos Jorge… só esta semana foram tantas… não encontrava o meu passaporte no aeroporto e tu passaste na mesma e encolheste-me os ombros, só me fizeste sinal que me ligavas quando chegasses.
—Mas encontraste o passaporte, estava na tua mala e vieste na mesma.
— A questão não é essa, tu vinhas para aqui sem mim!
— Já tínhamos pago isto. Aliás, eu já tinha pago isto. Vais continuar Vera? Eu também tenho razões de queixa, nem tudo é perfeito.
— Ai sim? O que foi? — meteu-se à frente dele. —diz! Vá diz lá uma! — empurrou-o.
— Não quero, não vou dizer, não sou de guardar ressentimentos.
Terminou o gin tónico e sentou-se na cama, a olhar para os chinelos do hotel. Eram felpudos demais para um clima tão quente e os pés transpiravam.
— Nunca te apetece fazer amor, por exemplo! —gritou de dentro do quarto para a varanda. Ela não respondeu. —E nunca fizeste um esforço para ver futebol! No início disseste que farias um esforço!
—Acabou, Jorge.
Com o fim do por do sol o vento amainou e as palmeiras imobilizaram-se. Ouviam-se risos e alguns splashes de mergulhos tardios.Vendo o seu próprio reflexo na tv desligada, ele enfiou as mãos nos chinelos e fez deles fantoches felpudos. Os fantoches ora discutiam e davam turras um ao outro, ora começavam aos beijinhos e a roçar-se. Parecia bastante entretido com isso.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

side-show bob dá show no Chelsea

O David Luiz ainda não compreende inglês. nada mesmo. Como se pode comprovar aqui em que responde a um 'are you happy with the game?' com uma expressão de 'wtf!? queres mesmo que eu fale?' e um im very happy. thank you thank you.. thank you. thank you boys. thank you chelss.", quase provocando um ataque de riso ao colega Essien.

Apesar das suas dificuldades de comunicação verbal, pela mímica, David Luiz vai-se impondo no Chelsea...



fábulas

Eu gostava de anedotas quando era pequeno mas para as contar à minha mãe, tinha de substituir os intervenientes da anedota por animais, para lhe conseguir chamar a atenção. Por vezes era um pouco forçado, mas ela ria-se à mesma. Penso que bastava incluir animais e pronto. É um humor muito pouco exigente.

Um carro vai cheio de pandas, quem vai a guiar?
O policia!

O que é que se diz a um panda num fato formal?
“O réu por favor levante-se”.

Quem é mais parecido com um macaco: um panda ou um leopardo?
É o leopardo , o panda é igual.

Como é que se começa uma maratona de guaxinins? Basta atirar uma moeda de cinco cêntimos colina abaixo.

Porque é que as sinagogas dos guaxinins são redondas? Para eles não se poderem esconder num cantinho quando chega a caixinha dos donativos.

etc.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

feira do livro, diálogos e toneladas de livros

Uma das coisas que gosto na feira do livro é de ver quem são os leitores, quem são as pessoas que compram tal e tal livro, quais os clichés.

Alguns diálogos ouvidos de relance:

- Estas traduções são muito boas, são do Filipe e da Nina Guerra, leva este.
- O Crime e Castigo? Não é muito pesado?
- Não, lê-se bem, a sério. Leva.
- Não sei... parece um bocado difícil...

(nota: passei exactamente pelo mesmo, isto de tentar convencer alguém a ler Dostoiévski, não sei porquê, há um tipo de leitores que olha com notável desconfiança qualquer coisa que se assemelhe a boa literatura e que não tenha capas com pétalas e chaves e desertos)

Intelectual, aos gritos, para a senhora a atender:
- Quero o Era do Vazio... é do Guies Lipovetsky, mas já deve saber isso com certeza. Eu sei que é um livro um pouco datado e tal, enfim, discorre sobre as novas relações sociais caracterizadas pela redução da violência e a transformação das suas manifestações em... obrigado, quanto é?

Intelectual com pinta de anarquista, folheia um livro numa editora refundida e às tantas vira-se para o pobre senhor solitário da banca:
- Pois... publicaram isto com estes desenhos... eu bem avisei o António, mas o António está-se a cagar. Para fazer estes bonecos pagavam-me a mim. É o costume, há pessoas que estão nestas coisas é para ganhar dinheiro com livros. Não fazem as coisas por amor à arte... é só aldrabões!
- Pois.
- É só aldrabões... olha para isto, está aqui uma rica coisa... pff...
- Pois é.


Eu ontem foi os 4 volumes do guerra e paz de Tolstoi, O Adolescente e o Coração Fraco e Outras Histórias de Dostoiévski, os três volumes da trilogia americana de John Dos Passos, a obra completa de um autor que agora não me lembra o nome mas que é incontornável etc. Depois para literatura juvenil, os contos de Oscar Wilde, uma farturinha, contos de Christian Andersen, Alice Do Outro Lado do Espelho de Lewis Carrol, as aventuras de Tom Sawyer de Mark Twain e o Trópico de Câncer do Henry Miller. Sei que os devia ter comprado em inglês mas um dia tenho um filho português.

E uma série deles que também são incontornáveis mas que não me lembro do nome, só sei que não os consegui contornar. A ver se nos próximos dias trato do resto. Gosto depois de empilhar as aquisições da feira em cima de uma mesa e ficar a olhar para elas, como se fossem o meu tesourinho. Ainda tenho alguns livros da feira do ano passado que não li, mas isso é apenas um detalhe.

os "crazy frogs" em 1984/85 tinham outro nível

terça-feira, 10 de maio de 2011

ser fotógrafo artístico de mulheres nuas é que rende

Um amigo meu é fotógrafo e está sempre a tirar fotografias a mulheres nuas, mas assim artísticas, com grão e a preto e branco. É melhor do que ser pintor de mulheres nuas, isso dá uma trabalheira desgraçada e é preciso ter jeito, não basta fazer um boneco daqueles como os do enforcado, com bolinhas a fazer de maminhas e uma bola grande a fazer de cabeça com um smiley e os bracinhos abertos. Um fotógrafo de mulheres nuas consegue despachar pelo menos uma por dia em sessões fotográfica e sai sempre bem, basta ter uma máquina digital no modo automático portrait ou até landscape, se ela for volumosa.
Às vezes não mostram a cara ou tapam as partes com objectos como livros ou com as mãos ou com uma pose dramática, como se estivessem a atrofiar com qualquer coisa, mas para o meu amigo fotógrafo é indiferente, ele viu tudinho enquanto elas se ajeitavam à pose e está-se bem marimbando para mim ou outros espectadores. Às vezes até ralho com ele ‘porra, não reparaste que a gaja tinha o livro mesmo ali em frente?’ e ele olha-me de lado com desdém.

é só fazer ali um clip da fotografia, mas ele fica com o original completo

e um gancho ou um elástico para o cabelo, não havia não?

Ele não gosta que eu diga “fotografias de mulheres nuas” mas o que é certo é que são fotografias e são de mulheres nuas a sério, não é photoshop. Elas nem são strippers ou prostitutas. Elas querem ver-se a si mesmas bonitas e artísticas, como nas fotografias artísticas de outras mulheres que quiseram o mesmo e assim sucessivamente. São muito invejosas!
O essencial na sua actividade de fotógrafo de mulheres nuas é conseguir manter-se neutro, sério, como os médicos por exemplo, quando eles se viram para as mulheres e começam com aquela história da apalpação mamária e do ‘dispa-se’. À menor coisa, os médicos dizem ‘dispa-se’ e fazem apalpações como espanhóis numa loja. Imagino que no dia a dia os médicos tenham algumas dificuldades em ser sociais, basta uma senhora queixar-se de qualquer coisa numa conversa de café que lhes sai um embaraçoso ‘dispa-se’ e esticam as mãos para apalpar a senhora como se fossem zombies.

uma dica: flash


Uma das manifestas limitações da escrita é a dificuldade em escrever mulheres nuas. De todas as artes, penso que é a mais infeliz, especialmente a prosa. Os poetas ainda é como o outro, mas como os poetas são tendencialmente homossexuais é um talento que não lhes serve de grande coisa.

já vimos poses mais naturais em politraumatizados de acidentes de motociclo

Já pensei em abordar mulheres na rua, como faz o meu amigo fotógrafo, com um cartãozinho a dizer ‘escritor’ e dizer-lhes que só precisam de se despir e ficar ali à minha frente enquanto as escrevo e até fazer uns ares dramáticos, como se estivesse muito concentrado. O problema é que o corpo é um objecto literário bastante desinteressante e considero a misoginia cultivada como uma característica essencial para um escritor a sério,o que faz com que os meus retratos tendam a ser pouco abonatórios. Imagino que o Picasso sofria do mesmo problema, 'o meu nariz não é assim, idiota!' etc.

Uma mulher nua é uma espécie de vazio em termos literários, tem muito mais piada uma mulher, por exemplo, a coxear subtilmente porque uns minutos antes o salto se lhe enfiou entre duas pedras de calçada e lhe torceu o pé. E ela vai mesmo assim à porcaria do copo de água, a disfarçar as lágrimas e a cerrar os maxilares para se conter e contém-se, contém-se, contém-se e depois quando chega o namorado ao pé dela com dois martinis e lhe diz ‘então marmotinha, tás com uma cara, deves estar com a tpm não?’ ela, discretamente, pisa-lhe um pé com o salto e aplica nele todo o peso do corpo mas multiplicado por quatro ou cinco, que é uma coisa que elas conseguem fazer e os gatos e os cães também quando temos de lhes dar banho. E depois ele também fica a lacrimejar e ficam os dois calados e com os olhos húmidos, tensos, a beber martinis como se não houvesse amanhã e as pessoas cochicham que entre eles já não há amor e que devem ter vindo o caminho todo a discutir e que são alcoólicos.

video com três pretinhas a cantar

(e a dançar)


(nesta época tinham a mania de as alinhar em pedestais ordenadas por altura

segunda-feira, 9 de maio de 2011

aquilo da Leya era a brincar, já agora

dei-lhes uns belos euros hoje:
Jorge Luís Borges, obras completas 1952-1972, Teorema (Leya)
Vladimir Nabokov, contos completos, volume 1, Teorema (tenho a impressão que já tinha comprado este)
John Fante, A confraria do vinho, Teorema (este tem uma capa absolutamente horrível e que tenho a certeza que não assenta ao John Fante por amor de Deus, quero acreditar, ou então o livro é mau)
Thomas Mann, os Buddenbrook*, Dom Quixote (Leya)

 admito que enchi alguns livros de nódoas de farturinhas mas foi porque fui às farturinhas mesmo ao pé da Leya e fui todo à ganância ver os livros.

Depois, noutros sítios
Rudyard Kipling, o Livro da Selva, tinta da china, uma edição belíssima!

amanhã entre as 22 e as 23 vou rapinar mais, especialmente na Assírio e na Presença, os três volumes do Guerra e Paz, todos do Dostoievski que ainda não tenho (o adolescente, por exemplo) - é o dia Filipe e Nina Guerra, cerca de 33% do meu orçamento feira do livro é investido em traduções do russo para o português e vocês deviam fazer o mesmo em ver de lerem coisas que não são essas.

*o lamentável erro deveu-se a esta capa (má) que estava aqui em cima da mesa, Buddenbrook aparece separado.

não julgues um livro pela capa, o tanas

"Vai tudo correr bem", dizem-me, quando manifesto as graves crises de angústia. Chego ao ponto de queimar o draft do meu romance em frente às pessoas e elas entram em pânico ahaha (é evidente que tenho aquilo em 4 backups digitais e só queimo prints de versões antigas). No outro dia a minha mãe até veio a correr da cozinha com as pegas do forno, as dos sapinhos, para tirar o draft da lareira. Gosto de brincar ao artista angustiado, prestes a ser rejeitado pelo mundo. Para onde quer que olhe, só vejo problemas. A rejeição é o menor deles.

O meu maior pesadelo é outro. É ter o meu nome num livro com uma capa de mau gosto. O meu nome sobreposto a uma foto de uma rosa no deserto ou uma merda assim.
Isto para mim não justifica sequer a ambição de ser escritor.

Se eu queria ganhar dinheiro com livros, então o livro teria forçosamente de agradar a uma grande editora. Mas tenho medo que me impinjam uma capa kitsch, com balõezinhos ou flores ou praias, fotografias, capas que gritam às donas de casa "sou fácil de ler, sou divertido, compra-me!"

Só as editoras falidas ou à beira da falência sabem fazer capas com bom gosto, é um facto. Estou disposto a preferir uma editora dessas, das obscuras, onde se tem de comprar os livros por mail e dão-nos o NIB do editor (que é o único gajo que trabalha lá - em part-time) e que disponibilizam o livro num armazém de uma rua esconça num arrabalde de Lisboa.

Eu sou da opinião que os livros se julgam pela capa, tal com as pessoas.

Não?  Então tentem não julgar este...


... ou este...

I rest my case.

Há bons designers. Por exemplo, o anónimo que fez o banner deste blogue é claramente alguém com talento e sensibilidade. Ele podia fazer a capa a troco de cerveja e tremoços. A propósito de designers e de capas lindas de morrer, deixo aqui algumas capas do pai do design português, Sebastão Rodrigues (1929- 1997).









Mas para mim, aquela que arruma tudo, é esta. Adoro-a.



sexta-feira, 6 de maio de 2011

hava di nice weekendo bambinas!

Tolan mentaliza-se e problema complexo envolvendo o Bibi

O Tolan tem uma forma muito peculiar de lidar com a rejeição e que passa por rejeitar quem o rejeita. Não é um processo imediato e ocorre sempre algum choque inicial, embora este tenha vindo a reduzir-se a breves segundos. Começou a desenvolvê-lo à porta do Lux.
—Desculpe, mas só com convite ou cartão da casa.
— O quê? Eu… oh… eu… mas toda a gente entrou, menos eu… eu… Eu não queria entrar na vossa estúpida discoteca de qualquer maneira!!!
— Eu sei, já me disse isso na semana passada e eu fixei a sua cara.

O Tolan não precisa assim tanto dessa capacidade de encaixar rejeição no dia a dia. Vou parar de escrever isto na 3ª pessoa. Não preciso. Tenho aquela máxima de que só eu me posso rejeitar, só eu sou o meu verdadeiro crítico. O problema que quando me rejeito a mim, por exemplo, por achar que fiz uma coisa péssima, tendo a rejeitar-me de volta, para não sofrer com a rejeição e assim sucessivamente. O que vale é que [ATENÇÃO: PIADA GEEK] no processo há alguma entropia a cada iteração e o todo tende para um tempo finito pelo teorema de Cauchy caso contrário era exponencial e eu explodia [FIM DE PIADA GEEK]

Também gosto muito de criticar os outros, especialmente as pessoas de quem gosto. Faz-me muita impressão ver coisas de amigos meus, especialmente artistas, fico mais nervoso do que eles, detesto vê-los fazer figuras de parvo em público.

Agora um problema muito engraçado, para eventual discussão (se não me aparecer aqui um cromo que já saiba a resposta).

Imaginem que o Carlos Cruz tem um novo concurso 1, 2, 3.

Há 3 portas, a porta 1, a porta 2 e a porta 3. Uma das portas tem um escuteirinho de 9 aninhos e as outras duas têm um Ferrari. O Bibi tem de escolher a porta certa para ter o escuteirinho e não lhe sair a porcaria de um Ferrari. O Bibi escolhe a porta 1! O Carlos Cruz, para ajudar o Bibi, abre a porta 2 e mostra um Ferrari. Dá-lhe a alternativa de ficar na porta 1 ou mudar para a 3.

Qual deve ser a opção de Bibi?

teenager



às vezes, quando estou mesmo com a neura de inspiração, recuo aos anos 90, os da minha adolescência. Foram anos de videos de cores e roupas saturados, fluorescentes, Parker Lewis, tartarugas ninja, Nivana, televisões privadas e meia dúzia de paixões platónicas nos corredores da escola.

A infância e a adolescência são os períodos mais interessantes na vida de qualquer pessoa porque têm o absoluto que a vida jovem ou adulta não têm. Dois bons adultos que se entendem têm tendência a, de certa forma, partilharem conhecimento, eu sei que tu sabes, tu sabes que eu sei. Um gajo quando tem 14 anos não sabe absolutamente nada, não tem nada a ensinar a ninguém e as outras pessoas têm tendência a agravar a confusão, dos pais aos amigos, das paixões platónicas aos professores, é tudo intenso e confuso.

A primeira bebedeira que tive foi de tequilla, no interior norte de Portugal, num acampamento numa reserva natural, não me lembro onde.

Sei que bebi vinho quente de malgas e depois tequilla, perante o olhar desconfiado de locais. Entornei um shot na mesa e sorvi a mesa, para gáudio de todos. Lembro-me que a M. e  L. e A. estavam lá e eu estava a apaixonado pelas três mas que numa velha ponte romana, entusiasmado pelos vapores etílicos, imitei um touro e os meus amigos, bons amigos diga-se, tourearam-me com agrado, o que eliminou hipóteses com a L. e a A.

Desviei-me do caminho e desci uma vereda cheia de árvores e silvas e deixei-me cair exausto debaixo de um céu estrelado e puro e cristalino, o céu da serra do interior norte, um céu granítico, diamantes em veludo negro. Estava eufórico da bebedeira, aquelas primeiras em que uma pessoa se sente bem e tal. Quando dei por isso, tinha a M. ao pé de mim, ficou preocupada, havia uma escarpa grande para um rio, cá em baixo e achou que devia tomar conta de mim, os outros que fossem andando e foram. Acho que ela queria  - viria a saber anos mais tarde - curtir comigo. Eu não sabia isso, porque raio é que... não sabia isso. O vento às vezes soprava muito forte nos pinheiros e ouvia uma coruja ao longe. Se não fosse ela a arrastar-me pelo braço de volta ao acampamento, tinha ficado ali a dormir.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

gosto muito de vocês todos

Acabei o meu romance, revi-o, reescrevi-o, algumas partes uma boa dúzia vezes, quase um ano de tempos livres, após uma dezena de tentativas frustradas, são 270 páginas A4, o que dá cerca de 400 numa paginação de romance.
Imprimi-o hoje pela primeira vez e gosto de mexer nas folhas e ver aquilo tudo, são muitas letras juntas, a formar frases inéditas. Um romancista de grande experiência e craveira, aconselhou-me a esperar e relê-lo depois, outra vez, com distanciação. Tinha vontade de o despachar já a torto e a direito para algumas editoras, acompanhado de uma carta em que explicava como a editora em questão podia ajustar o seu catálogo (eliminando alguns autores que edita, incluindo outros essenciais etc.) para poder incluir o meu romance e a minha pessoa na sua oferta, podia ajudar uma editora, mas como tenho vontade de fazer isso, acho que vou esperar uns tempos e fazer o que ele diz, entretendo-me com um ou dois contos. Agora estou enjoado, tanto que a sua conclusão, pelos vistos provisória, me suscitou uma alegria fugaz, como um orgasmo seguido de suspiro melancólico e sono, e não uma euforia prolongada como seria de esperar. A maior euforia prolongada que tive nos últimos tempos foi com o campeonato que o Benfica ganhou o ano passado e é essa que me serve de comparação. Durante semanas, enquanto tomava banho e esfregava bem ali atrás das orelhas, lembrava-me do Benfica campeão e nem ficava deprimido com o facto de ter de trabalhar dali por meia hora.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ultimate Dog Tease

Kitty is a very BAD Mystic

Sócrates self-motivational tape

...atuo da melhor forma possível em todas as situações. Mereço o amor que sinto por mim. Reconheço e uso meu próprio poder. Não importa o que os outros digam ou façam. O que importa é como escolho reagir e o que escolho acreditar a meu respeito. Sou amado e aceite exatamente como sou, aqui e agora. Tudo está bem no meu mundo. Minha auto-estima é alta porque respeito a pessoa que sou. Liberto-me de qualquer necessidade de luta ou sofrimento. Mereço tudo o que é bom. Sou um ser radiante, que aproveita...

- Mr Prime Minister? Mr Prime Minister, hello?
- Hmm? Hein? Hã? What?
- Mr. Prime Minister, I asked you a question, about the national debt estimates....
- Oh, yes, of corse, Mr. Jurgen Kroger, estimates are correct, more thing less thing. Would you like another litle bit of coffee?
- Thank you. And we will have to implement larger cuts on government spending as well...
- Spending, yes, spending is bad. People needs to spending less times on vacations outside.
- Mr. Prime Minister, are the translation headphones working?
- They are working very nice. Ó Teixeira vai buscar aí mais café para os senhores da Troika e vê lá o que é que eles querem, vê lá se é preciso mais águas, eu vou aqui... meter os fones da tradução outra vez...

... tenho a auto-estima e a confiança necessárias para avançar pela vida com facilidade. o melhor presente que posso me dar é o amor incondicional. Eu me amo exatamente como sou e não exijo nada de mim para me amar. Eu...

terça-feira, 3 de maio de 2011

as melhores raparigas têm problemas graves



Esta anda com uma pistola na mala, mas tem licença. Uma pistola a sério, carregada. Ainda não sei o que faz da vida mas dá dinheiro. Mostrou-me a pistola a meio de um jantar e, na mesa do lado, o casal de betinhos até se engasgou e não falou mais o resto da noite. Nem pediram sobremesa. 'A minha melhor amiga', comentou e riu. Depois mostra-me o telemóvel novo e o kit de maquilhagem mas eu ainda estou com a 'melhor amiga' na retina e com o garfo suspenso, petrificado.

É completamente paranóica com a cena dos homens. Odeia homens do fundo das tripas e percebe-se porquê, tem a maldição de ter um corpo moldado num estúdio de Anime 3D, entra num restaurante e faz-se um minuto de silêncio que se desmorona em recriminações de mulheres aos seus respectivos pares. Diz que a maior fantasia é 'dar um tiro nos tomates de um gajo quando ele levantar a mão ou a voz a uma mulher'. E eu também, uma vez que odeio pessoas em geral, homens inclusive. Ela gosta de mim, eu percebo isso pela forma como ainda não me deu um tiro. Sinto-me seguro ao pé dela, se ela estiver bem disposta. O truque é falar baixinho e não levantar a mão para chamar um táxi, pode confundi-la.

Não posso comentar a música que ouve no carro, mesmo que às vezes me venham as lágrimas aos olhos de estar a ouvir Celine Dion durante trinta minutos com ela aos berros a cantar por cima, a capota do carro para baixo, a 170km na A5. Tenho medo, a porra da 'melhor amiga' a dormir na sua mala, com um olho aberto a espiar-me. Às vezes passa-lhe uma sombra pelos olhos e fica como que meio alucinada, sem motivo aparente. Eu pergunto-lhe assustado 'o que foi? o que foi?' e ela em silêncio, à escuta, à porta de casa, a mão dentro da mala entre-aberta. Passos aproximam-se, finalmente oiço-os também. É só uma velhinha a pôr o lixo na rua. Alívio. A tensão dissolve-se num sorriso. Faz-me uma festa na cara e diz-me 'dorme bem cachorrinho' e eu vou para casa, com as mãos nos bolsos, a dar pontapés nas pedras. Das três uma, ou é da PJ ou traficante de droga ou ambos, mas simpatizo com ela.

mais uma achega

Levei a minha mãe a almoçar ao excelente Trás d'orelha de Torres Vedras e ela, depois de se alambuzar com espargos salteados em manteiga e uma costeleta de vitela brava com migas, confessou-me que leu a Aparição por indicação de alunos e achou aquilo chato, mau e novelesco. Eu comi pernil de porco estaladiço com batatas e cebola caramelizada e grelos salteados, senti-me como o Anthony Bourdain. Isto para dizer que o excelente Trás d'orelha é o melhor restaurante da zona oeste e fica a uns míseros 35 minutos de Lisboa pela A8.

Aparição - Vergílio Ferreira, notas terminais

Frio, aborrecido, paternalista, condescendente, pretencioso pretensioso* e sem uma centelha humana, a não ser o episódio, provavelmente real, do enforcamento de um cão doente na infância do narrador. Não me passava pela cabeça que as personagens e a atmosfera de Évora, bem esgalhadas, fossem apenas uma armadilha. O primeiro quarto do livro é bom porque ainda estamos na apresentação humana das personagens e o enredo é simples, a atmosfera apelativa. Mas quando a aparição começa a infectar os pobres dos fantoches, instala-se um teatro pedagógico para turma de liceu. É o equivalente a um filme que me mostraram em puto, para me alertar contra os perigos da droga. Há um fantoche para cada estereótipo, embora, curiosamente, falem todos praticamente da mesma forma, com a mesma voz melodramática, empolada e críptica, assim que são acometidos de aparição. Distante e condescendente, o narrador disseca o que acontece aos outros e finge um desespero existencial que tem tanto de credível como o Cristiano Ronaldo ser heterossexual.

Penso que num jovem o livro possa ter algum efeito e ser, mesmo, agradável e marcante e isso tem o seu valor também.

Desisto de o ler a duas dezenas de páginas do fim, foi difícil e masoquista chegar tão longe. É muito bem escrito, tecnicamente, apesar das inusportáveis repetições de palavras demasiado fortes, como "aparição", "estalar de" ou "ressoar". Se fizessem uma telenovela mexicana filosófica existencialista, seria assim. O próprio enredo é novelesco.

A quem se interesse por estas coisas mas em bom, é favor ler Dostoiévski, por exemplo, o Demónios.

Outra coisa, lembrei-me que desisti de outro livro do Vergílio em tempos, o Escrever. Foi-me ofertado por um grande amigo, que por acaso lê este blogue e, portanto, não vou explicar por que motivo não o cheguei a terminar. As minhas desculpas e eu sei que gostas de mim na mesma.
Lembra-te que eu te tentei convencer que o album Devil Without A Cause do Kid Rock era genial, por isso, estamos quites. Mesmo assim, fica aqui o video, pensa nisso melhor.



*quanto ao "pretencioso", que de facto é pretensioso, gostaria apenas de dizer três coisas:
- a busca "pretencioso ou pretensioso" dá mais de 4 mil resultados no google
- existem muitos repositórios de gramática supostamente oficiais como este que têm pretensioso mal escrito (pretencioso) e replicam o erro
- o comentador Luiz Pacheco teve piada :]

segunda-feira, 2 de maio de 2011

a última entrada de Bin Laden no seu diário secreto



Abbottabad, Paquistão, 1 de Maio de 2011

Querido diário,

Estou muito cansado por isso não vou escrever muito, não te zangues querido diário.
Portei-me bem hoje, bebi o chá de folha de laranjeira por causa do fígado e acordei cedo. Lanchei pão com queijo, bebi leite de cabra, executei um missionário católico e arrumei o quarto. Preparei o meu primeiro pão de ló sozinho, o Hassan, o Khamed e o missionário católico disseram que estava delicioso. Já passaram quase dez anos desde o onze de Setembro e hoje não resisti a reler a minha entrada desse dia. Só diz "Yessss!" mas é uma entrada que me diz muito. Espero festejar os dez anos em breve. Falta pouco. Apesar de estar feliz com o 11 de Setembro, também estou um pouco frustrado. Tenho tentado inventar uma coisa nova, só me conhecem por esse atentado e é uma coisa que me aborrece um pouco, querido diário, agora sei o que sentiram os Los Del Rio com a Macarena. Ando em tournee pelo Afeganistão, por Matosinhos e pelo Paquistão há quase uma década. Tenho feito muitas coisas giras e em minha opinião melhores, embora mais subtis e menos espectaculares. Sinto que o meu valor não é reconhecido, pois fica ofuscado pelo 11 de Setembro. Serei eu um one hit wonder? Tenho de inventar coisas novas mas tem-me faltado inspiração, admito, querido diário. Hoje no brainstorm criativo sugeri atirar um TGV contra uma central nuclear mas o Rahman Ismad começou com uma história qualquer de que não podíamos dirigir um TGV para fora dos carris e executei-o. Já ontem, como sabes, tinha sugerido espetar um space shutle no IKEA de Alfragide num Sábado mas blah blah não ouvi o resto, executei-o. Achas que sou um tipo de líder que não aceita críticas, querido diário? Mas chega de trabalho!

Não estou em Abbottabad há muito tempo e há duas miúdas que não me saem do turbante. Vi-as de relance no dia da chegada e pareceram-me jeitosas, pelo menos, a julgar pelos olhos a espreitar da burka. A Ameena é a que tem os olhos maiores, é boa como tudo. A Samina não tem olhos tão bons, são pequeninos mas bem feitos e firmes. São casadas mas já dei ordens para que os seus maridos sejam forrados com C4 do bom e tenham o privilégio de uma viagem de trabalho ao Afeganistão para trocarem as esposas por quarenta virgens. Sou muito generoso querido diário e... que barulheira é esta? Pareceu-me ouvir um helicóptero. Ando muito nervoso querido diário, o psicólogo disse-me que o stress me fazia mal e que era tudo minha imaginação. Ele tem razão, com um preto na Casa Branca o máximo que me pode acontecer é roubarem-me a carteira se não tiver cuidado... Olá... agora tiros. Deve ser Hassan e o Khamed, estiveram nos copos e estão outra vez a disparar ao acaso nos criados judeus. É melhor ir ver o que se passa, venho já.