segunda-feira, 19 de setembro de 2011

vamos tentar psicologia invertida

Gostava de ganhar uns trocos a escrever umas crónicas. Isso é que eu gostava. Sim senhoras, isso é que era uma rica coisa, tinha de ser um formato assim livre à lobo antunes ou miguel esteves cardoso. Se alguém me convidasse "tolan, eu pago-te estas centenas de euros por um texto teu". Isso é que era. Haviam de ver os textos, eu dava-lhes os textos mais filhos da mãe que já tinham visto! Passava fome para o escrever, abandonava o meu emprego, abandonava os meus amigos e a minha playstation porque "tenho de acabar uma crónica até 5ª feira!"

Seria para mim revolucionário ter a escrita equiparada ao trabalho, significaria que poderia levá-la a sério e não como um hobbit e tudo funcionaria em função dela! Tudo! E nunca mais teria uma reunião. Odeio reuniões. É só por isso que escrevo, quero um emprego sem reuniões por toma-lá-da-cá aquela palha!

As impressoras da tipografia até espirrariam tinta por todo lado ao imprimirem-me as crónicas e o papel chegaria húmido e quente às bancas! Os leitores sentir-se-iam excitadinhos só de passar as mãos pelas letras, eu faria sexo mental com todos eles! As vendas iriam aumentar em flecha e todos iriam elogiar o gesto de coragem do editor que descobriu e apostou num diamante em bruto desconhecido! Ah! Era bom.

E tinha de ter uma página só minha e com uma caixa a bold à volta do meu texto, para o enquadrar e isolar do resto da publicação porque eu compreendo que as outras pessoas que partilhassem a página contígua não pudessem estar ao mesmo nível... mas eu seria misericordioso para todos e até me esforçaria para não ser tão genial, só um pouco, ali ainda na fronteira do humanamente possível. Mas de vez em quando faria uma travessura e zás, espetava com um texto genial, textos que no espaço de duas linhas fariam as pedras da calçada chorar e alguém como o Cavaco Silva rir com gosto.

É pena que não haja editores assim em Portugal, é de facto pena.

Um editor justo e bom, corajoso, com bom gosto. Uma pessoa boa, amigo do seu amigo, mas ético e inflexível, um que não alinhasse em modas. E que fosse bem parecido também e bem sucedido. Uma pessoa fantástica, no geral, e que eu pudesse ser citada dali por 20 ou 30 anos e entrevistada em documentários sobre mim.

Mas eu compreendo. Sei que é complicado arriscar e que há muita pressão para não falhar. Sei que a vida de um editor ou director de publicação é complicada. É preferível apostar em valores seguros, testados pelo mercado e que é muito difícil que deixem uma marca pessoal, que se orgulhem mesmo daquilo que fizeram e da importância que o seu trabalho teve. É preferível agir da forma como sempre agiram, da forma como fazem os outros e que é aquilo que se espera deles e depois quando morrerem nem deixam nada de especial para trás, pagaram dinheiro a pessoas sem talento para escrever crónicas ou colunas invisíveis e assépticas, textos que o tempo rapidamente irá apagar, coisas sem estrutura literária, lixo, mero lixo reciclado de ideias batidas e clichés e piadas forçadas e tudo de uma alma baça e vulgar, aquilo que imaginam eles que é o espelho de um leitor medíocre, o tal que nem sequer compra jornais e revistas boas...

É triste, mas é perfeitamente compreensível e eu aceito bem.
Um abraço.

10 comentários:

Anónimo disse...

Eu compraria o jornal/revista onde escrevesses.
Fica aqui o meu contributo.
Marina

Anónimo disse...

«(...)que poderia levá-la a sério e não como um hobbit (...)»
Sim, de facto um «hobbit» é algo que não se pode levar muito a sério...
Cumps. da "Anónima" contra o acoro ortográfico. :)

Anónimo disse...

«(...)que poderia levá-la a sério e não como um hobbit (...)»
Sim, de facto um «hobbit» é algo que não se pode levar muito a sério...
Cumps. da "Anónima" contra o acordo ortográfico. :)

Diego Armés disse...

Anima-te, Tolan. Pensa em quantas crónicas do MEC já forraram caixotes de areia dos gatos. E quantas outras do Lobo Antunes já limparan vitrines de bolos em pastelarias de província. Pessoalmente, guardo o Pulido Valente para quando preciso de pintar os armários da cozinha. A vida deles também não é fácil...

G. Varino disse...

vai, tolan!! abre o peito às balas!!

Campeão disse...

Eu já usei Kafka para equilibrar uma mesa de jardim. Os terraços são tramados, a porra do chão é sempre irregular.

Tolan disse...

Obrigado Maria! :*

Anónimo disse...

Marina :) - bebe menos!

a.i. disse...

eu comprava as tuas crónicas se viessem com fotos da scarlett no meio e de outfits e mãos e pés com vernizes e assim no meio do texto


eha isto saiu muito parvo mas que se lixe


não a sério, eu comprava as tuas crónicas. não sou capaz de assinar uma revista, mas comprava as tuas.

Anónimo disse...

Tolan, pode ser que esse dia chegue mais depressa do que pensas... Um dia vais-te lembrar deste comentário...