Gostava de ganhar uns trocos a escrever umas crónicas. Isso é que eu gostava. Sim senhoras, isso é que era uma rica coisa, tinha de ser um formato assim livre à lobo antunes ou miguel esteves cardoso. Se alguém me convidasse "tolan, eu pago-te estas centenas de euros por um texto teu". Isso é que era. Haviam de ver os textos, eu dava-lhes os textos mais filhos da mãe que já tinham visto! Passava fome para o escrever, abandonava o meu emprego, abandonava os meus amigos e a minha playstation porque "tenho de acabar uma crónica até 5ª feira!"
Seria para mim revolucionário ter a escrita equiparada ao trabalho, significaria que poderia levá-la a sério e não como um hobbit e tudo funcionaria em função dela! Tudo! E nunca mais teria uma reunião. Odeio reuniões. É só por isso que escrevo, quero um emprego sem reuniões por toma-lá-da-cá aquela palha!
As impressoras da tipografia até espirrariam tinta por todo lado ao imprimirem-me as crónicas e o papel chegaria húmido e quente às bancas! Os leitores sentir-se-iam excitadinhos só de passar as mãos pelas letras, eu faria sexo mental com todos eles! As vendas iriam aumentar em flecha e todos iriam elogiar o gesto de coragem do editor que descobriu e apostou num diamante em bruto desconhecido! Ah! Era bom.
E tinha de ter uma página só minha e com uma caixa a bold à volta do meu texto, para o enquadrar e isolar do resto da publicação porque eu compreendo que as outras pessoas que partilhassem a página contígua não pudessem estar ao mesmo nível... mas eu seria misericordioso para todos e até me esforçaria para não ser tão genial, só um pouco, ali ainda na fronteira do humanamente possível. Mas de vez em quando faria uma travessura e zás, espetava com um texto genial, textos que no espaço de duas linhas fariam as pedras da calçada chorar e alguém como o Cavaco Silva rir com gosto.
É pena que não haja editores assim em Portugal, é de facto pena.
Um editor justo e bom, corajoso, com bom gosto. Uma pessoa boa, amigo do seu amigo, mas ético e inflexível, um que não alinhasse em modas. E que fosse bem parecido também e bem sucedido. Uma pessoa fantástica, no geral, e que eu pudesse ser citada dali por 20 ou 30 anos e entrevistada em documentários sobre mim.
Mas eu compreendo. Sei que é complicado arriscar e que há muita pressão para não falhar. Sei que a vida de um editor ou director de publicação é complicada. É preferível apostar em valores seguros, testados pelo mercado e que é muito difícil que deixem uma marca pessoal, que se orgulhem mesmo daquilo que fizeram e da importância que o seu trabalho teve. É preferível agir da forma como sempre agiram, da forma como fazem os outros e que é aquilo que se espera deles e depois quando morrerem nem deixam nada de especial para trás, pagaram dinheiro a pessoas sem talento para escrever crónicas ou colunas invisíveis e assépticas, textos que o tempo rapidamente irá apagar, coisas sem estrutura literária, lixo, mero lixo reciclado de ideias batidas e clichés e piadas forçadas e tudo de uma alma baça e vulgar, aquilo que imaginam eles que é o espelho de um leitor medíocre, o tal que nem sequer compra jornais e revistas boas...
É triste, mas é perfeitamente compreensível e eu aceito bem.
Um abraço.
10 comentários:
Eu compraria o jornal/revista onde escrevesses.
Fica aqui o meu contributo.
Marina
«(...)que poderia levá-la a sério e não como um hobbit (...)»
Sim, de facto um «hobbit» é algo que não se pode levar muito a sério...
Cumps. da "Anónima" contra o acoro ortográfico. :)
«(...)que poderia levá-la a sério e não como um hobbit (...)»
Sim, de facto um «hobbit» é algo que não se pode levar muito a sério...
Cumps. da "Anónima" contra o acordo ortográfico. :)
Anima-te, Tolan. Pensa em quantas crónicas do MEC já forraram caixotes de areia dos gatos. E quantas outras do Lobo Antunes já limparan vitrines de bolos em pastelarias de província. Pessoalmente, guardo o Pulido Valente para quando preciso de pintar os armários da cozinha. A vida deles também não é fácil...
vai, tolan!! abre o peito às balas!!
Eu já usei Kafka para equilibrar uma mesa de jardim. Os terraços são tramados, a porra do chão é sempre irregular.
Obrigado Maria! :*
Marina :) - bebe menos!
eu comprava as tuas crónicas se viessem com fotos da scarlett no meio e de outfits e mãos e pés com vernizes e assim no meio do texto
eha isto saiu muito parvo mas que se lixe
não a sério, eu comprava as tuas crónicas. não sou capaz de assinar uma revista, mas comprava as tuas.
Tolan, pode ser que esse dia chegue mais depressa do que pensas... Um dia vais-te lembrar deste comentário...
Enviar um comentário