domingo, 11 de setembro de 2011

o melhor é não se fazer nada

«Uma ocasião em que o interpelava quanto à questão de como acabariam os estados modernos e o mundo, e de como se renovaria o mundo social, guardou um silêncio longo mas, por fim, lá consegui arrancar-lhe umas palavras:
- Acho que tudo isso ocorrerá de modo muito banal - disse - Todos os Estados, simplesmente, apesar de «feitos todos os balanços orçamentais e dada a ausência de défices», se verão un beau matin, todos, numa atrapalhação definitiva e não irão querer pagar para, no meio daquela falência geral, se renovarem. Entretanto, todo o elemento conservador de todo o mundo se oporá a isso, porque será ele, justamente, o accionista e o credor, e não quererá admitir a bancarrota. Aqui começará, obviamente, a oxidação total, por assim dizer: virão muitos judeus e começará o reino dos judeus; em seguida, toda gente, mesmo aqueles que nunca possuíram acções e, em geral, nunca possuíram nada, isto é, todos os miseráveis, não quererão, naturalmente, participar nesta oxidação... Dar-se-á início a uma luta e, depois de setenta e sete derrotas, os miseráveis liquidarão os accionistas, evidentemente. Talvez tragam uma palavra nova, talvez não. O mais provável é que também vão à falência. A seguir, meu amigo, sou incapaz de prever seja o que for nos destinos que mudarão a face deste mundo. Aliás, podes sempre consultar o Apocalipse...
- Será tudo assim tão material? Será que o mundo actual vai ruir por causa apenas das finanças?
- Oh, é claro que referi só um cantinho do cenário geral, mas esse cantinho está ligado ao resto por laços, por assim dizer inquebrantáveis.
- Então, o que é preciso fazer?
- Oh, meu Deus, não tenhas pressa: isso tudo não vai acontecer tão cedo. De qualquer forma, de uma maneira geral, o melhor é não se fazer nada: assim, pelo menos, terás a tranquila consciência de não teres participado em nada.
»
Dostoiévski, O Adolescente (1875), tradução de Filipe e Nina Guerra.