segunda-feira, 11 de julho de 2011
Hans Christian Andersen
Tenho lido os contos de Hans Christian Andersen e para todos os efeitos, ele está lá. Os contos são estranhos. Não são minimamente lineares. As personagens são incoerentes, o tempo “cronológico” é completamente abstracto e mesmo os recursos da linguagem são inesperados. Há toda uma diferença para com os contos de Oscar Wilde por exemplo, estes últimos (e mais ou menos da mesma época) são bem mais “ocidentais” (e muito bonitos, é certo). Os contos de Andersen, até pela ausência de moral recordam-me contos muito antigos, escritos pelos Sufis (há uma edição disso na Assírio& Alvim) ou mesmo contos primitivos da Papua Nova Guiné. São histórias cheias de elementos oníricos e fortes, carregados de simbolismos primitivos, crueis e viscerais e cujo o curso é por vezes desconfortável por não se colar a nada do que deve ser uma história nem se preocupar com justificações. E uma criança a ler aquilo encontra uma lógica natural ou então empancará com detalhes que a um adulto parecerão inusitados. Por exemplo, em vez de perguntar "como pode um sapo falar?" ela perguntará "porque é que o sapo não arranja outra noiva?"
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5 comentários:
Agora que falaste nisto, lembrei-me daquele conto dele, da princesa e da ervilha, sabes qual é? Um principe para descobrir a verdadeira princesa com a qual se devia casar, punha por debaixo de vinte colchões e vinte mantas uma pequena ervilha, e só aceitou casar-se com aquela que acordou toda negra e queixosa no dia seguinte. lembro-me de ler isso, quando era miúda, e sem saber o que era "sexista" reagir com imensa estranheza, tipo "olha o esquisito!"
Sim, li esse. Bela moral... "só uma verdadeira princesa sentiria a ervilha no colchão". E fica-se com aquela ambiguidade: isto era satírico? É que não parece.
Quer mesmo uma resposta?
Porque faz tanto sentido um adulto interpretar histórias para crianças, quanto uma criança interpretar mitologias.
É através dos contos que a criança se revê, e interpreta livremente o mundo real, e o imaginário.
Aprende a lidar com medos, escolhas, inseguranças, ansiedades, e tantas outras emoções. Tiraria o lobo mau da história só porque a criança tem medo do lobo mau?
E quando aparecerem os verdadeiros lobos maus?
Honestamente, gostaria de ver, isso sim, uma crítica às histórias insipientes que pululam de frivolidades.
Acho que o da princesa pode satírico, agora, nunca para uma criança -acho que ali só pretende embelezar um universo idílico, das princesas como seres frágeis e delicados, abdicando da outra vertente moralista típica dos contos infantis (o que interessa é o interior e etc etc.) Em contrapartida, o conto do "rei vai nu" já é uma lição de moral para as crianças e satírico para os adultos.
Há uns tempos, li um conto dele e tive que omitir algumas partes à criança. A violência da história não era o ideal para uns bons sonhos.
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