Todos temos embirrações de estimação com vícios jornalísticos. A mim, nem são os frequentes erros de português. São a falta de informação e espírito crítico na análise de estudos publicados ou descobertas científicas e o uso indiscriminado do "alegado".
Um exemplo de alegado perfeitamente cretino:
A mulher que foi vítima de um sequestro numa dependência bancária no Porto sofreu “uma perfuração na zona do abdómen” e “escoriações”, encontrando-se “estável e consciente” (...) a vítima, de 43 anos, “está em recuperação”, encontrando-se já "a receber visitas”. A mulher foi vítima de um alegado roubo, seguido de sequestro, na área de uma caixa Multibanco de uma dependência bancária na rua Damião de Góis, na quarta-feira, cerca das 22h00. Público
Suponho que haja uma cadeira de jornalismo em que os testes consistem em preencher espaços em branco antes de qualquer facto ou pessoa numa reportagem sobre crimes com a palavra "alegado".
E depois, os estudos. Acredito que os leitores deste blogue já exclamaram, uma vez ou outra na vida, que "todos os dias sai um estudo a dizer A e depois outro a dizer B" etc. De facto, quem se ficar pelas notícias nos jornais pode chegar à conclusão que os estudos só servem para entreter. Por exemplo, veja-se este belíssimo título da referência que é o Jornal i:
Portugueses são dos menos bêbados do mundo
Não só o uso da linguagem é discutivel para um jornal que supostamente tenta estar no campeonato do Público ou DN, como o teor da notícia é suspeito.
Portugueses, espanhóis, gregos e italianos partilham uma característica: são dos povos mais sóbrios do mundo. Um estudo divulgado pelo Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos mostra que México, Rússia, Ucrânia e África do Sul são recordistas em consumo de álcool e que alguns países europeus, a Austrália e a América do Norte são as zonas do mundo em que menos se consome bebidas alcoólicas.
O último estudo da OMS, uma instituição um pouco mais credível que o misterioso "Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos" que pelos vistos estuda o mundo inteiro, volta a colocar Portugal no 14º posto mundial de consumo de álcool, um valor que seria o 8º se não fosse a utilização de estimativas para consumos não declarados (mais elevados em países de leste por exemplo).
Felizmente, ambas entidades usaram o mesmo software para fazer o mapa:
O mapa do estudo do Centers for Disease Control and Prevention
O mapa da OMS (olha nós ali a roxo escurinho eh eh)
A questão aqui não é não noticiar o estudo do Centers for Disease Control and Prevention, mas sim que o jornalista, (neste caso, Sílvia Caneco) não desconfie ou não ache contraditório que de repente venha a lume um estudo com uma nova ordem mundial no que respeita a consumo de álcool e, no caso de Portugal, diga exactamente o oposto que décadas de informação das mais variadas fontes, destronando-nos de um pódio que por acaso eu até gosto.
Parte disto poderia ser contornado se tivessemos no corpo da reportagem um prático link para o estudo original e pudessemos fazer o resto do trabalho que o jornalista não fez. Não consigo encontrar o estudo da Centers for Disease Control and Prevention e acho estranho que não consiga e a Sílvia Caneco consiga, uma vez que o site da Centers for Disease Control and Prevention é bastante fácil de utilizar. Só vejo estudos relativos aos EUA. O da OMS consigo, é muito giro. Gostava de comparar as metodologias um do outro e perceber a origem do desvio. Manias, mas ninguém me ganha ao Buzz por algum motivo. O que me parece é que o da OMS é calculado pelos volumes de álcool vendido e consumido, daí que só em 2011 tenhamos os dados de 2005. O outro parece referir-se a drinking patterns, ou frequência de consumo digamos assim, uma informação que terá sido obtida por amostragem e inquérito. O meu conselho continua a ser o mesmo: não levem a sério qualquer alegada informação nos alegados jornais sobre estas alegadas conclusões....
9 comentários:
A despropósito da maioria do teu post: niguém te ganha ao Buzz?? É porque nunca jogaste cmg ao Buzz musical...
As vezes que ouvi isso... se soubesses... o meu nick na PSN é aguia77, marca dia e hora para jogar online. Não sei se dá para escolher tema, mas podes jogar com 4 ou 5 amigos contra mim, eu não me importo.
Sou imbatível no buzz.
É discutível e não "discutivel". Espero que não leves a mal a correcção de uma jornalista que não usa muito a palavra "alegadamente". Um beijo
também há o vício jornalístico do "idoso de 60 anos", que me leva imediatamente à questão: mas estes camelos destes jornalistas não têm pais?
Por isso é que disse que não irritavam os erros, eu dou muitos.
Outra vez a dizer mal dos jornalistas, Tolan?!?
Ainda bem que não está aqui exemplificado nenhuma ("alegada") situação que tenha ocorrido em jornalismo televisivo...
E vocês estão a esquecer-se do que acontece todos os verões quando, andando o pessoal arrasquinha com calores de trinta e muitos graus, quando não mesmo quarentas, e vem a anormalidade que calha apresentar o telejornal dizer, com um estúpido sorriso de orelha a orelha, "para amanhã prevê-se a continuação do bom tempo, devendo a temperatura rondar os 40 graus". Puta que pariu! Eu pegava no(a) anormal e espetava com ele(a) um dia inteiro à torreira do sol para ver se a besta ao outro dia ainda tinha a lata de vir dizer que tinha estado bom tempo.
É pá desculpem lá, a malta anda é à rasquinha. Pronto.
Tens razão anacriontico. Aliás, não sei se foi em França ou em Portugal, mas houve uma forte seca que estava a prejudicar gravemente a agricultura e os agricultores pediram aos senhores dos telejornais que parassem de dizer "continuação de um óptimo tempo" no telejornal para anunciar temperaturas tórridas e seca.
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