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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

grandes livros que não acabei: Under The Volcano - Malcolm Lowry

Ao contrário do comum dos mortais, eu não só acho que os gostos são discutíveis e educáveis, como sou muito humilde perante o consenso crítico, mesmo em obras que me escapam. O caso mais flagrante foi o Under The Volcano, livro que tentei ler, na versão original, recomendado por pessoas que me recomendaram outras coisas muito boas e com as quais tenho bastantes afinidades. Toda a premissa do livro é muito boa e a atmosfera extraordinária. A escrita é fenomenal e lembrou-me o Heart of Darkness do Conrad na capacidade de traduzir um delírio negro em palavras. Mas foi-me insuportável nos flash-backs biográficos que cortam e incham o livro em longas passagens irrelevantes. Recordo-me particularmente do flashback da viagem de barco do protagonista e das canções que compunha e da história de ser judeu. Tenebroso e fez-me pensar várias vezes "foda-se Lowry, vai-te foder, para lá de atrofiar e continua a porra da história, estavas na taberna tão bem a descrever o ambiente". Era muito fixe se fosse simplesmente um gajo bebedo numa aldeia mexicana a ser salvo pela mulher que o vem buscar e só isso chegava, assim um On The Road mas em literatura. Para mais, achei-o confuso. Uma sensação muito semelhante a outro grande livro de que já desisti duas vezes, o Ulysses de James Joyce e também o Sexus do Miller, livros a que provavelmente voltarei um dia (e a este under the volcano também). Parecem livros demasiado adultos para mim. O traço comum nas obras que referi ali na lista dos 10 livros (há muitos mais) é uma coisa a que eu chamaria de verdade. Talvez eu seja um gajo simples, mas aprecio, cada vez mais, que um autor não feche a sua obra, não a torne críptica nos detalhes. O todo até pode ser fechado. No cinema, lembro-me de um dos meus filmes preferidos, o Lost Highway do David Lynch que, apesar de ser críptico no global, é uma sucessão de cenas poderosas, simples e belas, sendo que o todo se torna num enorme mistério onírico e negro, deixando-nos suspensos no vazio, a mesma sensação da escrita de Becket ou de Kafka.
Se o livro não puder ser compreendido por um puto de 14 anos, tenho desconfiança, penso "estamos perante um gajo demasiado adulto". Não existe uma passagem do Dom Quixote de Cervantes, o maior romance de sempre, que não possa ser compreendida por um puto de 14 anos. O Livro do Desassossego, a melhor prosa portuguesa jamais escrita, é simples, honesto, verdadeiro, puro. As Aventuras de Huckleberry Finn, de Mark Twain, um livro aparentemente juvenil, é considerado por muitos (por mim nomeadamente) o melhor romance americano. A grande literatura para mim tem de ter um carácter infantil, directo. Dito isto, longe de mim dizer que o Under The Volcano é um mau livro e que uma pessoa deve fugir dele. Também tem piada encontrar livros assim e ser confrontado com algo que nos questiona, eu tenho respeito pelo livro. Desisti de muitos outros pelos quais não tenho respeito nenhum porque são claramente uma merda, não é o caso.

A propósito, deixo só esta cena do Lost Highway.