domingo, 15 de janeiro de 2012

pasteis de Belém e teologia


Quando foi nomeado, um amigo meu próximo ficou em estado de choque com o erro de casting. Para me convencer, começou por reduzir a cinzas o seu percurso académico. O tipo dava aulas numa "universidade lá fora" (medíocre), os seus escritos e artigos sobre economia eram meras enumerações de factos e evidências, sem uma visão consistente e definida. Mas o golpe que me convenceu foi a citação de bocados do Diário de um Deus Criacionista. O livro, para além de mal escrito e banal, é obra de um hamster deslumbrado, convencido não só da sua inteligência como da originalidade das suas ideias desenvolvidas na rodinha na sua gaiola. Ao contrário do meu amigo, que leva a economia e os destinos do país a sério, eu fiquei muito entusiasmado com o que viria ai: uma personagem digna do Eça, materializada no mundo "real" e debaixo de holofotes, sob pressão. O potencial cómico disto era enorme. Até vinha do estrangeiro e cheio de modernidades americanas (canadianas, enfim, foi o que se arranjou). As personagens do Eça não nos instigam ódio, pelo contrário, até sentimos alguma ternura. Não se pode achar o Álvaro má pessoa ou mal intencionado ou enervante como outros erros de casting (Fernando Nobre) ou aquelas pessoas que não entendemos bem a necessidade de existirem no nosso televisor (Miguel Relvas). Começou tudo muito bem com o seu pedido para que o tratassem por Álvaro, o primeiro sinal de modernidade e progresso civilizacional. Também foi gira aquela ideia da rede de abastecimentos low cost, a revolução nos transportes, a insistência nuns obscuros efeitos do fim da TSU, o fim da crise em 2012... Infelizmente, Passos percebeu o erro de casting (ou explicaram-lhe) e retiraram ao Álvaro a possibilidade de me entreter regularmente. Chegámos ao ponto de ver  um Ministro dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas) anunciar uma nova linha de crédito para as PME. Todas as semanas tiram ao Álvaro um dossier, uma pasta e remetem-no para uma semi-obscuridade que, junto de um grupo de imbecis fiéis, lhe dá uma aura de seriedade e trabalho: "ele não aparece porque está a estudar as coisas e a trabalhar, é uma pessoa séria e não está para mediatismos". A pessoa séria e que não está para mediatismos, há dias teve um momento alto, quando falou no pastel de belém. Podia ser uma metáfora de Cavaco Silva, mas não, referia-se mesmo às natas, ao pastel de nata. O risível não é o exemplo em si, que não seria mau se fosse inserido num discurso que abordasse os problemas estruturais que dificultam o empreendorismo e as soluções que um Ministério da Economia iria apresentar para potenciar o mesmo. Afinal de contras, estava a falar para empresários no papel de ministro da economia. Mas perante uma plateia de empresários incrédulos, Álvaro, intrépido e em modo entrepreneur Donald Trump style, expõe o seu plano de domínio mundial com um franchise de pastéis de nata e traça o paralelismo com o frango ao piripiri do Nandos, porque aquilo está cheio de estrangeiros a fazer fila todos os dias, eles adoram aquilo! Chega ali, dá uma ideia aos empresários, todo contente, e vai-se embora :) Veni vidi vici! É muito bom. Gostava que lhe dessem a pasta da cultura. Seria delicioso vê-lo sugerir a uma plateia de intelectuais que se "franchisasse" o conceito de sucesso do Shakespeare em 97 minutos em peças como Becket em 60 minutos, Tcheckov em 75 minutos ou Brecht em 45 minutos. Fica aqui a sugestão, tenho muitas saudades de Santana Lopes e dos seus violinos de Chopin, quando era secretário de estado da cultura no governo do pastelão de belém.

2 comentários:

Anónimo disse...

Vou ser franco:
Andava a hesitar se deveria ou não retirar a subscrição no google+ deste blog.
Nada de demasiado grave, mas temos de seleccionar, que o tempo disponível não é muito, e últimamente estava a ficar irritado com algumas elucubrações sobre, por exemplo, automóveis e futebol (ainda por cima benfica) assuntos para os quais a minha atenção é preguiçosa.

Mas depois vêm pérolas como "aquelas pessoas que não entendemos bem a necessidade de existirem no nosso televisor (Miguel Relvas)."
OK, mantenho
Abraço

Izzie disse...

Oh, Tolan, precisavas de me destruir o ideal? Já tinha um projecto para uma barraquinha tipo stand em Times Square, a vender bica pingada, pastéis de nata e jesuítas :(

(claro que o Nando's tem saída e filas. já alguém provou a comida inglesa? venham mil Nando's - o franguinho não é beeeem churrasco, mas é bom e temperado, que é mais que os ingleses são capazes)