Ir cortar o cabelo é uma coisa que me chateia. Só vou quando o meu aspecto se aproxima perigosamente de um cantor pimba dos anos 80 cujo aspecto se aproxima perigosamente do aspecto do Jorge Jesus.
Os barbeiros cortam mal que se fartam e por isso corto em "cabeleireiros" e é um momento na vida em que tenho de por de parte a minha heterosexualidade. Especialmente aquele momento em que, depois de me lavarem a cabeça, tenho de andar com uma toalha enrolada de um lado para o outro ou de me porem molas coloridas a prender madeixas quando cortam ou de usarem mais de um produto no cabelo, como aquilo do amaciador.
Perguntam-me "tem preferência?" e eu escolho sempre o gay do salão. Há sempre um gay no salão, mas nunca mais de um. Isto porque eles são muito territoriais. Os donos dos salões gostam de ter lá um gay porque o gay confere sofisticação ao salão e dá aos patrões uma desculpa para terem mais meia dúzia de suburbanas baratas a mascar chiclete, daquelas com o cabelo todo frito e alopécia de experimentarem uma cor diferente todos os dias.
Eu escolho sempre o gay porque acho que temos de ajudar as pessoas que precisam e também porque os gays são os únicos que levam aquilo mesmo a sério, como aquele café que eu vi lá em cima que tinha só deficientes a servir à mesa e eles serviam muito mais dedicados e concentrados que os empregados brasileiros por exemplo e as pessoas nem ficavam chateadas do cego despejar o chá todo ao lado da chávena ou do autista fingir que não ouviu o pedido e que não os está a ver de braço esticado no ar há meia hora. Os gays estão concentrados e são perfeccionistas. Às vezes entusiasmam-se um bocado e começam a fantasiar com a hipótese de eu usar espuma para efeito despenteado ou se quero gel. Às vezes saltitam à minha volta com a tesoura tshk tshk tshk tshk e estão em tal frenesi criativo que tenho medo de mexer e ficar sem uma orelha ou uma vista, mas admiro-lhes o entusiasmo.
Eles são mesmo bons naquilo, nascem ensinados, aos seis anos já fizeram quatro mises à bárbie da irmã e um corte escadeado à franja da cocker spaniel. E nessas alturas eu penso que se calhar era positivo para a sociedade em geral que aos gays fosse dada a hipótese de terem empregos sem ser cabeleireiro, estilista, modelo, poeta, decorador, padre ou toureiro. Acho que era bom que os houvesse na economia, na política, nas empresas, nos organismos públicos, nas autoridades. Infelizmente existe um forte preconceito nas pessoas em geral e acham que os gays só podem é ser cabeleireiros. Eu acho que eles podem ser tudo o que quiserem e a sociedade devia aceitar que um gay também é uma pessoa acima de tudo. É só uma questão deles estudarem um bocadinho e de nós os ajudarmos a integrarem-se nesse tipo de profissões, porque há regras apesar de tudo e isso de saltitar e fazer lip-sync à shakira que está a dar na Rádio Cidade não funciona bem em todas as profissões, excepto as que citei acima e que são normalmente reservadas para os gays.
7 comentários:
As preocupações estéticas de um homem que é homem devem-se apenas cingir ao seu dever cívico de não andar sujo, roto ou a cheirar mal. Ponto.
Eu, pela parte que me toca, procuro ser o mais prático possível: faço a barba e o cabelo ao mesmo tempo, normalmente uma vez por semana, aproveitando a máquina de cortar o cabelo (pente zero) para desfazer a barba. E assim se matam dois coelhos com uma só cajadada.
Gostei! De tudo em geral E de tudo em particular, principalmente da montanha de ironia. Bem esgalhado Tolan!
Começa nos gays, passa por deficientes cegos, autistas, brasucas...
Não é um gato cutxi cutxi mas lê-se ;)
Gostei.
Ó Wc Pato, está tudo muito bem mas para além disso pode ter um cheirinho bom e umas roupas giras. Não há conflito de interesses.
Adorei a parte do toureiro!
"um gay TAMBÉM É uma pessoa"
a criticar o preconceito constróis uma frase preconceituosa...e não digas que foi propositado.
oh wc pato...com esse nick name bem podes abster-te de tecer esse comentário!! =P
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