Li há poucos dias o Tom Sawyer de Mark Twain (a melhor pessoa que já viveu).
Apesar de serem dois livros aparentemente próximos (o Huck é uma personagem secundária no livro do Tom e depois sucede o contrário), são na realidade muito distintos. O Huckleberry Finn foi finalizado uns seis ou sete anos depois, com muita reescrita à mistura e tem um tom bem mais sério e por vezes melancólico e é, justamente, considerado por alguns (nomeadamente o Tolan e o Hemingway só para citar dois nomes de peso) como a obra 'mãe' da literatura moderna americana. A gande diferença técnica entre os dois é que o Tom Sawyer é contado na 3ª pessoa e o Huckleberry Finn na primeira pessoa. Enquanto que no livro de Tom Sawyer a consciência de Mark Twain, jovial e irónica, é uma referência e uma âncora (várias vezes o Mark Twain dirige-se directamente ao 'leitor'), no Huck, a escrita na primeira pessoa (um puto espontâneo e sem educação) causa um estranhamento mais poderoso e intenso.
Tenho feito uns exercícios nesta voz juvenil, uns ensaios dispersos a tentar encontrar as bases para o romance. É difícil encontrar o equilíbrio entre um "eu" de agora e um eu com uma idade que nem consigo bem precisar, com um misto de inocência mas que também deixe espaço para a ironia e alguma profundidade.
Talvez tenhamos tendência para subestimar os miúdos, eu certamente nunca fui pessoa de falar com crianças com a voz alterada e de forma simplória, como se fossem debilóides. Lembro-me de isso me causar forte irritação logo aos 3 ou 4 anos, os beliscões nas bochechas e a forma como por vezes oram falavam comigo, ora de mim na 3ª pessoa aos meus pais como se eu não estivesse ali "ele é sempre assim tão calado e sério?"
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