Todos temos sinestesia em maior ou menor grau. Por exemplo, o som do giz num quadro ou um garfo num prato provoca-nos uma sensação fisicamente desagradável e arrepios.
Os sinestésicos vêem cores quando ouvem música ou ouvem sons quando vêem cores. Nabokov era sinestéstico e conseguia descrever cromaticamente uma determinada música.
Quando oiço a primeira parte, o “Solid!”, berrado por uma voz estilo audições dos ídolos, no anúncio do Santander, sinto princípios de enjoo e vejo flashes vermelhos que antecedem, como um reflexo de Pavlov, a explosão de dor física e a náusea ao ouvir o “solid as a rock” que se segue.
O bocadinho até aos 0:14 segundos.
Aquela sucessão de notas do “solid as a rock” a seguir ao “Solid!” tem qualquer coisa de demoníaco e, honestamente, preferia ouvir a Mafalda Veiga a ter um orgasmo, ou um garfo num prato, a ouvir aquilo. Ontem estava na cozinha a tirar uma lasanha do forno e ouvi, da televisão, aquele “Solid!” berrado como se não houvesse amanhã. Hesitei seriamente em largar a lasanha no chão para tapar os ouvidos antes do “solid as a rock”. Estoico, aguentei, mas fiquei com os olhos a lacrimejar e cheio de tiques nervosos.
Não são só as vozes tenebrosas. Tem a ver com a sucessão de notas. Dificilmente se arranjaria uma nota pior colocada do que aquele último acorde sem entrar nos misteriosos domínios do jazz. Mesmo tocado num piano, aquela sucessão é capaz de me causar calafrios. Experimentei no meu sintetizador. A última nota, no “as a rock”, está errada. Sei que a música original é assim, mas a música original também está errada, foi mal composta. O “Solid!”projectado tem qualquer coisa de entusiasmo (exagerado) e anuncia uma explosão, um crescendo, depois da pausa, mas depois a música cai para um acorde maior pífio, demasiado “baixo”, uma coisa mais conservadora que o Bento XVI a congelar sopas no congelador ao fim de semana, uma coisa assim daquelas que tocam nos casamentos dos betos em Cascais. Em termos rítmicos, a música, em vez de arrancar, atola-se toda de cada vez que há um espasmo de bateria. É mesmo, na minha modesta opinião, o pior pedaço de música que a história já criou e faz-me sentir fisicamente doente. Entretanto, no Buyology do Martin Lindstrom, o especialista de neuromarketing, sugere-se que o medo é a forma mais eficaz de meter coisas na memória das pessoas. Resultou comigo. Vou lembrar-me para sempre que nunca abrirei uma conta no Santander.
5 comentários:
e ainda pões ai o vídeo para que outros possam sentir a náusea. Estou contigo, mas fizeste bem em aguentar a lasanha *
Isso e eles terem as comissões de manutenção e taxas e essas cenas todas que os bancos inventam para nos levar dinheiro mais caras do mercado!
lol muito bom, eu não teria dito/escrito melhor.
sim, o medo. the clockwork orange e beethoven :)
Há sons que me dão náuseas, esse jingle é um deles, relatos de futebol na rádio idem. Também há outros que me contraem o intestino de tal forma que tenho mesmo de ir a correr à casa-de-banho, como um dos moços dos Dzrt (é assim que se escreve?) desde antes do grupo ou o João Pedro Pais. Juro que não é embirração gratuita, é mesmo uma reacção fisiológica.
Obrigada por me fazeres sentir um bocadinho menos freak. ;)
o meu filho de sete anos tem as mesmas reacções. "aiii mãe que eu não aguento este anúncio. mude mude!".
já eu, como a minha vida é fazer "réclames", vou-me habituando a este tipo de dores dilacerantes.
mas é sim, mau. muito.
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