O protagonista do For Whom the Bell tolls do Hemingway, o Robert Jordan, luta contra os fascistas na guerra civil de Espanha. Não se sente comunista ou republicano, mas tem a certeza de que o fascismo é mau. Em termos práticos, ele acaba por ser tão ou mais eficaz contra os fascistas que os seus camaradas.
Entre os camaradas, são poucos os que têm efectivamente uma consciência política. Numa guerra confusa como a que é descrita no livro, feita de células de resistências mais ou menos autónomas, cada homem tem os seus motivos para combater e para não combater.
Numa das melhores passagens da literatura que já me foi dada a ler, executam-se fascistas, um a um, numa aldeia tomada pelos guerrilheiros. São executados à paulada e atirados de um penhasco. O facto de se executarem um a um, leva a que o juízo colectivo do povo oscile entre o ódio (há fascistas mais filhos da puta) até um sentimento de mal estar (tipos inofensivos que mesmo assim devem ser mortos).
No fim, a psicologia de massas leva a melhor e, por causa das palavras ofensivas e desafiadoras de um dos fascistas, os restantes são executados sem qualquer hesitação, de forma selvagem, por uma populaça embriagada e feroz.
Tudo isto deixa um travo amargo na consciência da camarada Pilar, espanhola que simboliza precisamente o "ideal da república". Foi uma coisa feia, como ela resume, um dos dois dias mais tenebrosos da sua vida. «Qual foi o outro?» pergunta o Robert Jordan e ela responde «O dia em que os fascistas retomaram a aldeia.»
3 comentários:
É de arrepiar, o excerto de que falas.
Gostei muito, muito deste post. Tem um bocadinho a ver com um certo "relativismo" histórico. No entanto, e no Por Quem os Sinos Dobram (por todos nós... :) ), acho que é claro que continua a haver o lado certo e o lado errado da História. São é difíceis de definir...
Quanto à psicologia das massas, ela a mim assusta-me e muito. Kierkegaard, com o qual concordo em tudo o que disse (quer dizer, do pouco que sei sobre ele) dizia que a multidão mente e que a verdade está no indivíduo. Tendo a concordar.
Mas, enfim, é tudo relativo. :)
Devo ter lido esse livro aí hás uns vinte anos e nunca me esqueci dessa cena: Os executores em duas filas e os condenados pelo meio, fugindo das pauladas em direcção ao abismo.
Vivo em Espanha e lembro-me muitas vezes disto.
É uma cena brutal. Gosto muito da forma como ele cria expectativa para a cena (a Pilar recusa-se a querer que a inocente Maria oiça, porque vai ter pesadelos) e depois consegue superar a expectativa.
Rita, também tendo a concordar.
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