A propósito da crónica da desilusão da Rita Maria com a última manif falhada deste sábado (e da qual só soube por um post sobre desilusão o que já diz um bocado sobre o tema), a minha desilusão definitiva ocorreu na última manif a que fui, a 11 de Fvereiro, no terreiro do paço, organizada pela CGTP. Tinha muita gente trazida de autocarro, mas foi penoso de assistir aquela homilia. Um português laico, digamos assim, sente-se instrumentalizado como estatística exagerada (300 mil...) por uma força que se tenta apropriar da indignação, em vez de a servir, em vez de se ajustar a ela e procurar pontes. Talvez isso explique os fracos números e a indiferença geral face a esta de sábado, poucos meses depois.
Os sindicatos parecem ignorar que de cada vez que os trabalhadores dos
transportes ou da TAP fazem mais uma greve, prejudicando em primeiro lugar os portugueses que usam esses serviços ou a própria economia nacional, estão a passar um sinal
muito claro aos portugueses de que primeiro estão os deles, os seus objectivos, depois o país, mesmo que isso, vamos admitir, não seja verdade. A mobilização da sociedade civil só se consegue fazer quando os sindicatos ou os partidos de extrema esquerda encontrarem um mínimo denominador comum com a generalidade da população e as suas próprias convicções.
O ponto de partida dos sindicatos, do PCP e de grande parte do discurso do BE ou do PS quando está agora na oposição é o de que todos os 'direitos' são sagrados. Quando não se tem a honestidade intelectual de partir do princípio que o
dinheiro dos contribuintes é finito, que o estado actual de coisas era insustentável, que levou a um endividamento galopante e que estamos em "falência", então foge-se à discussão
essencial que seria discutir e defender os direitos mais
importantes e quais as opções possíveis. Ainda ontem tive de desligar o rádio porque o BE questionou o Governo sobre o encerramento de 53 estações dos CTT considerando o direito a ter um posto dos CTT como algo de sagrado (como Seguro considera a RTP sagrada etc.) Portanto, tudo é sagrado, nada custa euros, nada provoca endividamento, assimetrias e injustiças. Mesmo num contexto de crise grave, o encerramento de uma estação de correio torna-se um cavalo de batalha válido, atirado ao barulho no meio de discussões que seriam mais agregadoras e que, de resto, o PCP e o BE são os principais catalizadores (corrupção, despesismo, evasão fiscal, BPN, PPPs, perdão de dívida / alargamento dos prazos etc.) A própria "greve" é uma forma de luta que exclui outras vítimas da crise: os desempregados, os jovens recém licenciados, os empresários (também são trabalhadores) que encerram actividade com dívidas, penhora de bens e processos no fisco, os profissionais por conta própria etc.
Se eu pensasse assim, poderia defender com unhas e dentes um direito que descobri há poucos meses Posso tirar uma licença de paternidade de 3 meses e receber 100% do meu salário, sem pagar IRS. Significa que eu que já ganho bem e tenho possibilidade de ter filhos, vou receber ainda mais dinheiro e que alguém que esteja desempregado ou ganhe mal ou tenha tido o azar de estar sem trabalho e subsídio durante os últimos 8 meses da fórmula de cálculo, como amigos meus que gostavam de ser pais, recebem muito menos. Porquê? Os filhos dos ricos exigem mais manutenção e roupa de marca e precisam de uma extra-help? Para mim faria mais sentido creches públicas, abono fixo mais elevado etc., mas claro, conto com um sindicato para defender os meus direitos adquiridos e sagrados.
7 comentários:
Concordo contigo. Eu sou anti6 greves. Ponto. Portugal não se calcula em Excel, mas é um excelente paradoxo.
és tão lindo… gostei imenso do post, mto claro e objetivo, sem frescura nem agressão.
ambos os dois, tu e a Rita Maria, de quem gosto imenso de ler, acima de tudo pela postura, já lho disse, inclusive, me comovem, com a crença profunda de que os partidos, sindicatos e políticos de que ambos falam põem interesses que não exclusivamente os seus (e isto inclui andarem a chatear-se e a moer o juízo uns aos outros, mto + do que a concentrarem-se, TODOS, em arranjar soluções) à frente dos dos portugueses, contribuintes ou f*didos com a crise, ou seja, todos os portugueses menos as classes priviligiadas, que são quem decide tudo e, portanto, se poupam. Não conheço um, um que seja, que o faça. Um… (os exemplos dos resgates aos bancos são o os mais gritantes) Mas ambos os dois, tu e a Rita, ainda me vão dando alguma esperança, pq a verdade é que adoraria acreditar nisso…
Quanto à tua questão relativa à paternidade, meu querido, se assim não fosse, ninguém tinha filhos, porque ninguém, ou mto poucas pessoas, se podem dar ao luxo de não trabalhar para ficar em casa a cuidar dos filhos. Mal ou bem tu fizeste uma escolha, a de trabalhar fixo para uma empresa, são as garantias que conseguiste na sequência dessa escolha. E talvez não te devas sentir culpado por ganhares relativamente bem… Eu escolhi não só ser freelancer como ainda não estar vinculada a empresa nenhuma, trabalho em casa, daí que não tenho nada, nada do que têm as pessoas que trabalham em empresas. e vou-te dizer, é muita, mas mesmo muita coisa, vocês não fazem a mínima ideia... Mas eu escolhi essa vida e não a troco por nada. Solidarizo-me com os freelancers em geral apenas por um motivo, porque nós não temos um pay check ao fim do mês, trabalhemos 20 horas por dia, 7 dias por semana, sábados, domingos, feriados, Natal inclusive, se for preciso. Nós não temos horários, temos prazos, doa a quem doer. O problema dos freelancers é não lhes pagarem como a toda a gente, a tempo e horas, o que torna verdadeiramente impossível fazer grandes planos a longo prazo. Fora os descontos que nos pedem, pornográficos, eu diria, só porque nos "dão" trabalho muitas vezes. Olha...
Besos
Bom póste.
R.
belo post
Não é que discorde em absoluto mas discordo de algumas formas (dizeres que os sindicatos defendem os direitos 'deles' coloca em ti um igual ónus de egoísmo, ao não assumires os direitos 'deles' como 'nossos') e fico sempre com uma pequena comichão quanto a como pode alguém tão novo ser tão pouco radical (no pensamento). É já a paternidade que aí vem a tornar-te conservador?
Muito bem escrito
Porque não levas o argumento ao fim lógico? Proibir a greve. Tens medo?
Misturas tudo. Erras em tudo o que dizes aqui. Tens obrigação de conhecer a crise bancária. Tens obrigação de saber que uma estação remota dos CTT presta um serviço essencial ao país e às populações. É evidente que tens de ter prioridades e juízo a gastar o dinheiro dos contribuintes. Não entrares de cabeça com milhões em instituições bancárias fraudulentas para evitar perigos sistemicos e depois ficares a roer o osso porque não tiveste, não cuidaste de ter uma legislação mundial que regulasse melhor a actividade bancária etc...
Comoves tão lacrimejante com o teu escrúpulo em teres direitos sagrados muito à custa dos teus amigos pobres. Ideia, passa um cheque a uma instituição de caridade com esse dinheiro que o Estado quer gastar contigo. Não peças é que os outros percam licensas de paternidade. A Segurança Social não é uma caixa para pobres. É um sistema que, em primeiro lugar, trata dos que estão no sistema. Dos que descontam. Ouvi dizer que é moderno, criado pelo Bismarck e assim. Se não gostas podes sempre emigrar para o burkina faso e ser (rrico, como grita o Louça) à mesma.
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