segunda-feira, 6 de maio de 2013

sponsoring

Esta terça-feira celebra-se o Dia Internacional do Livro e para os clientes da Caixa Geral de Depósitos (CGD) poderia ter sido um dia em que receberiam um livro de graça. A parceria foi estabelecida entre a editora Saída de Emergência e a CGD, que só no final da semana passada percebeu que alguns livros não seriam adequados à imagem do banco pelo seu conteúdo erótico e linguagem menos apropriada. Por isso , hoje não houve livros para ninguém.  

Como seria de esperar, depois disto, vieram as reacções de repúdio por tão censório, hipócrita e conservador acto da CGD. Isto confunde-me, porque pensava que a banca era o diabo e vai-se a ver e precisam dela para o dia do livro. E confunde-me porque quanto o coitado do Catroga, que é um gajo dos bancos, disse "isso são pentelhos", pimba, caiu-lhe tudo em cima. Homessa, este país é confuso. O banco não censura as obras, apenas não as patrocina, mesmo que tenha sido uma decisão um pouco tosca num banco que até tem experiência no campo cultural. Aquilo que sobressai disto da CGD é que nem conheciam os autores. Só falta convidarem o João César Monteiro para fazer o próximo anúncio do Caixa Woman e rejeitarem, mesmo à última da hora, o anúncio em que uma mulher nua nada crawl numa caixa forte cheia de moedas de euro enquanto recita Camões. 

O Dia Internacional do Livro foi uma ocasião para efectuar um determinado tipo de negócio, para o qual é necessário dinheiro do banco. Se não fosse preciso o dinheiro do banco, a Saída de Emergência não precisaria do banco para distribuir os seus livros de forma tão altruísta numa espécie de dumping cultural (outro debate interessante é se distribuir livros gratuitamente não é em si uma forma de despromoção do livro e dos respectivos autores, mas...). 

Contra isto não tenho absolutamente nada. Espero um dia ganhar prémios ou ser patrocinado e distribuído num pacote em que o cliente abre uma conta e recebe um iPad com uma edição digital do meu romance intitulado "O amor é tramado". Para manter o meu nível de vida, precisava de ganhar um daqueles prémios da PT todos os anos e mesmo assim, devo ter de desistir da sportv. A vida está difícil. Paguem-me e podem ter a certeza que não envergonho ninguém. Tenho experiência de grandes empresas eu, muitos bancos, muitos CAs, muitas reuniões. Sei comportar-me. E sei que muitas das iniciativas culturais das empresas obedecem a critérios instintivos, digamos assim. Por vezes, navegam um pouco ao sabor do gosto de administrador A ou B que considera que as coisas da cultura tem um certo panache e glamour que não se obtém com o futebol. E eu concordo, até porque não jogo futebol. E dentro da cultura, há gostos para tudo, também, talvez haja por aí um administrador ou um júri ou alguém que me considere irreverente qb mas não demais. Bom para reposicionar o sponsoring do banco numa vanguarda mais jovem, assim tipo poemas do Peixoto nos muros, como aqueles patrocinados pelas tintas CIN. Eu até tinha um bom poema para isso, chamava-se "Colar de Pérolas", começava com "o teu pincel já pinta?" e tinha uma pintura de uma mulher semi nua com salpicos de tinta branca no peito e no pescoço. Mas não o quiseram, já tinham irreverência com o Peixoto e ele tem tatuagens enquanto que eu pareço um betinho. Não há nada como estar no meio dos artistas na qualidade de mecenas, seja como representante de uma empresa ou do estado. A vanguarda da nação no beija mão. Os artistas também se sentem aconchegados, alimentados e acarinhados, especialmente num país em que nem dando livros de borla metemos estas bestas a ler.

Sem comentários: