domingo, 13 de janeiro de 2013

radicais (reescrito)

«Resumo assim: a vida do humano mais asqueroso vale mais do que a vida do animal doméstico de que mais gostamos. Sempre. Tendo tido (e continuando a ter) quase sempre animais domésticos (de que gosto imenso), parece-me haver em muitos defensores mais radicais dos direitos dos animais um discurso que relativiza os direitos humanos. Porque não compreendem a sua absoluta excepcionalidade. - Daniel Oliveira

Sobre o caso do cão que matou o miúdo de 18 meses, não subscrevo a petição contra o seu abate, mas de qualquer forma, é só uma petição e isto num país onde há touradas. A minha família já abateu um cão violento. Mordeu muita gente. A mim rasgou-me um dedo e arrancou-me uma unha, eu devia ter oito ou nove anos. A gota de água foi ter-se atirado à cara de uma vizinha idosa, podia tê-la morto. Foi o meu próprio pai que o matou com uma injecção de pentotal e foi um dos dias mais tristes na nossa história familiar. Tudo, na vida, são problemas práticos. Era um perigo constante, para mim, outras crianças, vizinhos. Evidentemente, eu era miúdo e não concordei, nem mesmo quando me arrancou a unha. Em vez de odiar o cão, fiquei foi a odiar a vizinha por ter entrado em casa sem bater à porta quando sabia que tínhamos um cão completamente doido. Fiquei-lhe com um pó durante anos. Um dia ela virou-se para mim e perguntou-me "estás de mal comigo?" e eu respondi-lhe "não" e senti-me bestialmente mal por lhe querer mal e passou-me tudo. A vida é muito confusa.

Não trocava a vida de qualquer dos meus cães pela vida dos tais seres humanos mais asquerosos teóricos de que fala o Daniel (no caso dele serão George Bush? Milton Friedman? Margaret Tatcher?) O Daniel Oliveira trai-se em dois pontos no parágrafo. O primeiro é dizer que gosta imenso do seus animais domésticos. Nenhum dono de cão ou gato se refere a ele genericamente como "um animal doméstico", sem sequer especificar se é cão, gato, cágado ou periquito e dar-lhe um nome. E segundo, não se gosta imenso. Gosta-se imenso de uma mala Chanel ou de uma t-shirt do Che Guevara. Um animal doméstico, ama-se. Ama-se como se fosse um membro da família, um melhor amigo, um companheiro. E o Daniel trai-se ao dizer que não compreendemos a absoluta excepcionalidade da vida humana. Temos católicos nos sítios mais inesperados, ocorre-me dizer, até no Bloco de Esquerda. Pensar que a vida humana é, à partida, mais excepcional que outras formas de vida, parece-me um radicalismo absoluto.

Em qualquer caso, as pessoas da petição não estão, ao contrário do que Daniel Oliveira parece acusá-los, a defender a troca de vida de inocentes pela vida do cão. Estão talvez a remar contra procedimentos automáticos e imediatos que a justiça e a sociedade tem para com os animais em Portugal, um país onde ainda são torturados em rituais bárbaros e onde a lei os considera "coisas", muito por culpa desse antropocentrismo religioso e de insensibilidade. Infelizmente, nem com Darwin fomos lá e se não fosse Copérnico, ainda era o Sol que girava à volta do Daniel Oliveira e o seu carácter absolutamente excepcional.

31 comentários:

MDRoque disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
MDRoque disse...

Os animais humanos , são, de entre os animais, os mais asquerosos de todos.

pássaro viajeiro disse...

Bom-dia.

Tem bem mais de imbecil que de católico.
Para o Daniel de Oliveira que defende a preservação da mais execrável criatura humana em detrimento do mais fiel animal, em que patamar coloca os direitos à existência de uma mulher, uma mãe, que tranca os filhos num quarto e os assa em vida?

Anónimo disse...

não sei o que escrever, mas tenho de escrever. OBRIGADA. porque me revejo em cada palavra que aqui deixaste e por existires na blogosfera.

Ricardo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ricardo disse...

Isto faz-me lembrar um bocado aquela cena das touradas: ambos os lados começam a tomar posições cada vez mais extremas e desprovidas de sentido.

Ainda assim, matar um cão não é solução... Mas, dizer, como disse a senhora que lançou a petição: "o meu filho de 18 meses não estaria sozinho na cozinha às escuras" é de uma imbecilidade heroica

A. disse...

O problema desta frase é que apela às nossas emoções, distraindo do texto sobre o assunto, e que na minha opinião diz o essencial.

O cão arrancou parte da cabeça da criança. Ponto. Deveremos, enquanto sociedade, arriscar que arranque um bocado da cabeça de outra que por acidente tropece nele?

E possível garantir que não voltará a acontecer?

Ricardo disse...

Luna, obviamente que não devemos arriscar isso: este cão tem que ser colocado num sítio onde é possível evitar que isso aconteça.

A. disse...

E que sítio é esse? Em que condições? Pago por quem?

(tipo prisão para cães que são perigosos?)

RCA disse...

Bravo Luna

Ricardo disse...

Tanta gente que quer proteger o animal, certamente algum canil ou abrigo para cães se oferece para ficar com o animal.

A. disse...

Pagos por quem? De onde deverá vir o dinheiro para o sustento do animal no resto da sua vida: dos contribuintes?

Ricardo disse...

Espero que não venha daí. Espero que um canil municipal não seja a solução.

Como te disse, não devem faltar privados que queiram ficar com cão. Nem que seja só por boa publicidade.

Tolan disse...

Ricardo, não sei se seria boa publicidade. Em minha opinião (e é por isso que não me revejo na petição), estes casos são desnecessários e atraem má publicidade. Há tantos animais maltratados, abandonados, a lei portuguesa é tão miserável na protecção dos animais etc. que não entendo a necessidade de escolher um caso provocador e polémico como este que envolve um pitbull, uma raça proibida em vários países civilizados e um animal que matou uma criança.

Ricardo disse...

Tolan, eu também não sei se seria boa publicidade. Acredito é que há pessoas convencidas disso.


YTn disse...

Só Asneiras.

Izzie disse...

É muito má publicidade, e criam animosidade num país onde ainda não é (e devia ser) penalizado o tratamento cruel de animais. Estes fanáticos fazem recuar a luta pelos direitos dos animais, e nem dão conta. E isso irrita-me, não há nada pior que uma mob acéfala.

Anónimo disse...

Olá Tolan, enquanto não perceberes que o sol gira à tua volta, precisamente à tua volta, não perceberás nada e de nada te vale leres o Dostoiévski ou o Bukowski.

S* disse...

É isso. Assinei a petição e não me arrependo nada de o ter feito. Como bem referiste, não assinei a petição por achar que um cão vale mais que a pobre criança. Assinei porque, embora lamentando profundamente a morte da criança, não posso concordar que um cão que nunca tinha feito mal a ninguém seja visto como um monstro assassino. Nada justifica o que aconteceu, mas eu consigo aceitar a justificação de que, muito provavelmente, o cão se assustou. Isso não traz a criança de volta, mas matar o cão também não a traz de volta.

Como bem disseste, há bichos com tendências mais... violentas. Tiveste um cão assim, eu já conheci gatos e cães assim. É como em tudo na vida, toda a regra tem a sua excepção. Os bichos são fabulosos, mas existem algumas ovelhas negras.

Quanto ao Daniel de Oliveira, "gosta imenso" dos seus animais domésticos. Já eu amo as minhas princesas gatuchas. Dá para notar a diferença, certo?

Anónimo disse...

Finalmente alguem que nao se deixa levar em extremismos e analisa o problema como ele é... Estava a ver que so se apanhava ignorância nesta net à conta do cão...

sneto disse...

K belo texto... e subscrevo totalmente! Eu assinei a petição, não porque não tenha pena da criança k morreu, mas porque acho k os direitos dos animais ainda são pouco defendidos e, por isso, nunca é demais levantar a voz por eles! E sim, eu amo as minhas meninas! (tenho 2 gatas!)

Vespinha disse...

Estou contigo, muito.

Tolan disse...

S*, se assinaste a petição, não estás comigo. Penso que deixo claro as minhas reservas quanto a pit bulls, por factos estatísticos muito claros. E entre os pit bulls, um que tenha morto uma criança, naquelas circunstâncias, sim, acho que é um perigo enorme e imprevisível e qualquer solução tem de ser definitiva. Se é o seu abate, não sei, mas se são abatidos mais de 100 mil cães e gatos por ano, consigo viver perfeitamente com a solução do seu abate. Não significa que considere que o cão tenha uma responsabilidade criminal, essa na minha opinião está nos donos e devia estar de forma muito forte.

Tolan disse...

Acrescento que me choca um bocado ver pessoas a prontificar-se para o adoptar. A minha família já adoptou três cães, mas nunca me passaria pela cabeça irmos buscar um pit bull que matou um bebé de 18 meses para o ter em casa. Para além de terrivelmente mórbido e do risco para nós e para outros, acho que é próprio de um fundamentalismo imbecil.

Tolan disse...

Há tantas causas pelos animais, já aqui escrevi várias vezes sobre algumas, como a criminalização dos maus tratos ou de abandonos, de deixar de equiparar os animais domésticos a "coisas" que podem ser torturadas impunemente. A legislação portuguesa é completamente atrasada nesse campo. E aí acho que haveria consenso, excepto para meia dúzia de fundamentalistas católicos que veriam nisso o braço do ateísmo na ameaça do estatuto intocável dos homem, incluindo os seus padres pedófilos e do Santo Padre Homofóbico.

Tolan disse...

A única consequência visível da petição foi permitir aos Danieis Oliveiras exprimir opiniões como aquela, em resposta a uma péssima imagem que muitos defensores dos direitos dos animais deixaram neste caso. Eu até li comentários de pessoas que acham que se o cão matou um bebé de 18 meses, foi porque foi provocado. Preferia não ver ter visto essas coisas.

Peppy Miller disse...

Efectivamente ainda não tive tempo suficiente de ler sobre o assunto e de perceber o que realmente se passa e quem é esse Daniel Oliveira. Mas que os ânimos vão aquecer vão!!

Jude disse...

Um aplauso a estas palavras!

Diana disse...

E de que vale o abate do cão se os donos não são culpabilizados e podem adquirir com a maior das facilidades outro animal, que poderá atacar uma pessoa? Abatem-se os animais, mas os donos saem sempre impunes. Quanto a manter o animal numa 'cela' com o dinheiro dos contribuintes...bem, é o que acontece com as pessoas asquerosas que matam e violam sendo animais racionais e fazendo-o, portanto, com plena consciência dos seus actos. Se calhar deviam ser abatidos para não dar despesa. E sou daquelas que, como já disse, punha a vida da minha cadela à frente da desse tal senhor chamado Daniel Oliveira.

Paula noguerra disse...

Mais bem dito impossível!
PARABÉNS XXXX

Anónimo disse...

"O Ministério Público abriu um inquérito judicial, para apurar responsabilidades."

Se existem responsabilidades por apurar, então o relatório de autópsia não foi conclusivo sobre o ataque do cão. Consta que a causa de morte do bébé foi traumatismo craniano e que não existem sinais de mordidas ou arranhões.