Quando era puto, por vezes faltava às aulas para jogar snooker a dinheiro, depois tive de parar porque avisaram os meus pais e nem o facto de eu ter média de 18 os convencia do meu método de estudo. Comecei a partir dos 16 anos. O responsável pela sala de jogos não nos deixava jogar com menos de 16 anos, apesar das nossas insistências. 16 anos era mesmo a idade mítica. Acho que nunca desejei tanto ter uma idade como 16 anos. De aí em diante a idade passou a ser uma abstracção. Treinava todos os dias e passava fome porque gastava o dinheiro do lanche em snooker e por vezes perdia e tinha de dar coisas (CDs, jogos) para pagar as dívidas. Outras vezes ganhava e sentia-me o rei e pagava rodadas de imperiais (deixavam-nos beber, jogar é que não). Depois aos fins de semana às vezes jogava em casa de um amigo que tinha mesa e à noite, quando podia sair, ia ao bar com mesa de snooker no centro da pequena cidade e desafiava tipos velhos, com 19 anos por exemplo, que jogavam contra mim, com as namoradas dengosas a suspirar de tédio. Ficavam ali, observando o namorado, um rechemengo maçarro de peito feito, a dar uma lição no geek desengonçado. Juntavam-se amigos e curiosos, a observar, de copo da mão, ao som do saturday night da wigfield.
Começava sempre avassalador, à tom cruise na cor do dinheiro. Inspirado e eufórico, visualizava trajectórias, era arrojado, tinha nota artística, metia bolas com duas tabelas, fazia curvas dando tacadas quase na vertical, usava efeitos... Mas quando chegava à bola preta, mesmo que fosse uma jogada fácil e básica, eu projectava mentalmente o acto de falhar, os meus braços ficavam tensos, espasmódicos e, sob os olhares dos estranhos e da namorada do mongo, falhava mesmo, deixando a preta à porta. Outras vezes dava uma castanhada idiota na preta e a branca acabava por entrar, perdia o jogo. Como prémio levava umas palmadinhas no ombro, tap tap tap e o tipo voltava para o pé da namorada, de peito inchado e eu para casa, de mãos nos bolsos vazios. Nunca ganhei nenhum jogo nesse bar.
Mais ou menos pela mesma altura, em 1994, vi o Baggio falhar aquele penalti contra o Brasil com um chuto para a estratosfera, entregando o título mundial. O melhor jogador do mundial marcar um penalti assim, um chuto daqueles, milhões de pessoas a ver, o fim de uma carreira marcado por um falhanço trágico. E os brasileiros a festejar o título aos saltos, felizes porque ele falhou, não dependeu deles, foi ele que falhou, foi ele que decidiu o título mundial. E depois o ar de resignação dele, a olhar para o chão, mãos na cintura, o desejo de desaparecer do planeta. É muito mais interessante um penalti falhado do que um marcado, que é o que se espera. O que importa é o estilo e querer, genuinamente, vencer. Um título é uma nota de rodapé na história.
agora vingas-te no poker.
ResponderEliminarChorei neste jogo, chorei baba e ranho com pena do Baggio. Anos mais tarde este amor valeu-me a ida ao jogo dele de despedida da selecção e um beijinho.
ResponderEliminarQuanto ao snooker, a minha média fava-me um certo conforto para passar horas agarrada ao taco (salvo seja). Beijos
Il codino divino...saudade....
ResponderEliminarO snooker pode ser um mundo muito tortuoso. Daí que eu, mente simplista, sempre tenha mantido aí um conhecimento superficial e desenvolvido capacidades em artes mais básicas como as dos matrecos.
ResponderEliminarNo que a penalties e momentos de vencer, ainda assim, dêem-me mil vezes um Baggio que falha do que casos como o do Bebeto que, apesar das histórias que falam de lesões etc, se recusou a bater um penalty no último minuto e custou assim um título ao Corunha.
Prefiro o tipo que falha no momento decisivo ao gajo que se retira do momento decisivo para não falhar.
O que não tem nada a ver com o medo de falhar em qualquer uma das ocasiões...
Mak, quanto a matrecos, é a minha especialidade. Chamam-me "the special one" e "CR7". Não estou a brincar :D Penso que a PS3 e a coordenação olho/mão e o facto de ser meio ambidextro ajudam.
ResponderEliminarIsso e treinar sozinho às vezes. Sou uma pessoa doente :\
Eu fiz o percurso também chamado "De trás para a frente". Tornei-me um colosso defensivo e, depois de saber que aí pouco mais restava, avancei para a frente para dar largas à minha imaginação.
ResponderEliminarDe special features só posso citar o facto de ser canhoto, ter potencial criativo e ser ser acutilante na arte do trash talking...
ahaah eu sou péssimo no trash talking ^_^ e mau à defesa, mas se eu jogar à frente, o meu meio campo é uma barreira intransponível. Também sou mais tendencialmente canhoto (escrevo com a mão esquerda, dou socos com a mão direita, posso fazer os dois ao mesmo tempo)
ResponderEliminarMak, Tolan, já vi que sabem que os matraquilhos são um jogo individual e não de equipa como pode parecer aos mais incautos. Só por si, isso já revela que são jogadores especiais. No meu curriculum, tenho uma vitória contra o Manel João Vieira, o músico, já bastante embriagado (eu). Isto dá-me uma certa mística, acredito
ResponderEliminar"Um título é uma nota de rodapé na história." - nice ;)
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