segunda-feira, 4 de junho de 2012

Tolan e Plaft, no Spa



Depois de meses a ser sujeito a um programa de esquerdamento por parte da Plaft, que envolveu, entre outras coisas, andar de autocarros da Carris e sair à rua para tomar café no 1º de Maio com a Plaft a puxar por mim e a bater palmas (em vez de me barricar com as latas de atum e a pressão d’ar como nos anos anteriores), decidi que eu também iria tentar fazer com que a Plaft se chegasse um pouco mais à direita.
Sendo a Plaft uma mulher de esquerda e ainda por cima artística, pus de parte qualquer tentativa de aproximação racional. O importante é a experiência, é isso que as mulheres procuram hoje em dia quando usam um perfume, têm um filho ou arranjam um emprego: experiências. Por isso reservei um fim-de-semana num hotel & spa 5* para lhe dar a experiência de como vive uma mulher de direita no dia-a-dia. Expliquei-lhe o meu plano e, para minha surpresa, ela não demonstrou grande resistência. Disse-me que sim, que estaria disposta a fazer esse sacrifício e ser uma cobaia. Transferi todos os meus fundos do PPR e da conta poupança para a conta à ordem, fiz um cartão de crédito gold e pude reservar um quarto no hotel.
Devo dizer que eu próprio nunca tinha metido os pés num hotel de spa. A atmosfera zen de relaxe fez-me subir os níveis de stress porque comecei a sentir que tinha de me sentir relaxado visto que estava a pagar bastante por isso. Fazendo as contas, cada minuto de relaxe estava a custar-me meio jogo de playstation novo. A Plaft pareceu-me bem à vontade, vestiu imediatamente o roupão e os chinelos e foi toda contente para o Spa. Eu fui atrás dela com o roupão e o meu speedo da Adidas. Pelo sim pelo não trouxe também os óculos de natação, o cloro arde-me os olhos. Fiquei muito confuso com o menu de tratamentos. A Plaft escolheu logo o balanceamento dos Chacras com pedras quentes e desapareceu numa sala escura e a cheirar a óleos perfumados, deixando-me sozinho no meio de uma floresta de bambu. Estava à espera de ver um panda de toalha à cintura a qualquer momento, mas em vez disso, só passavam por mim saudáveis pessoas de direita, bem bronzeadas e com medalhas e crucifixos ao peito, relógios de ouro e dentes bem brancos.

Também pensei em brincar ao balançar chacras mas se calhar era uma coisa só para mulheres. A Plaft sugeriu-me a vinoterapia mas isso é uma coisa que eu faço todos os dias, achei um bocado estúpido vir a um hotel tão caro quando uma boa garrafa se compra por cinco euros no mini preço. O funcionário do hotel, um jovem daqueles com um pé à frente do outro e a cabeça de lado, também não parecia disposto a ajudar-me, até porque eu fingia saber exactamente o que estava a fazer e não demonstrava precisar de ajuda. Abri o menu tratamento para homens: tratamento esfoliante regenerador, tratamento remineralizante desintoxicante… parecia-me indicado para vítimas de Chernobyl... Continuei a ler o menu… às tantas decidi que ia escolher ao calhas. Aponto com o dedo, leio e digo: “quero um facial intensivo”. O senhor com o pé à frente do outro sorriu e disse-me para o seguir, mas eu fugi e escondi-me no sítio mais hétero que me pareceu haver, o banho turco. Tudo cheio de vapor, não via absolutamente nada e a temperatura era sufocante. Parecia o ip4 numa manhã de inverno com a chauffage no máximo. Aquilo sim, era um ambiente de homem. Às apalpadelas encontrei o banco de pedra e azulejo encostado à parede. Sentei-me e pensei “agora vou descontrair caralho”. Nisto, vejo que estou mesmo ao lado de um tipo qualquer, também de toalhinha, todo a transpirar. E que do outro lado está outro gajo. Os meus olhos começaram a adaptar-se ao vapor todo e descubro com choque que somos os únicos naquela sala do banho turco. Fui-me sentar mesmo entre os dois. Tudo vazio e eu vou-me sentar mesmo entre os dois. Às tantas começam a falar um com o outro, conheciam-se e ficaram um bocado acanhados quando eu cheguei. Olhei para o relógio e exclamei “ena, as horas que são, tshh tenho de ir descontrair depressa noutro lado” e saí do banho turco e entrei numa cabine que dizia duche tropical, todo a transpirar e a ofegar. Era um mero cubículo forrado a azulejos e com um grande botão a dizer “START”. Ainda hesitei um pouco mas carreguei no botão. O duche tropical consistia num duche gelado com muita força com água a vir de muitos sítios, o que fez um relaxante contraste com a minha temperatura elevada do banho turco. Tudo extremamente relaxante. Depois de me erguer do chão onde caí devido ao choque térmico e à força da água, saí do duche tropical. Encontrei-me com a Plaft que vinha da sauna e já com os chacras todos balançados. Ela queria o banho de chocolate. Disse-me o preço e eu comecei a fazer contas mentalmente, com o volume cúbico da minha banheira e embalagens de nutela e estava quase a tentar demovê-la quando reparei numa cintilação nos olhos da Plaft, algo de novo no sorriso… uma espécie de brilho interior de prazer e felicidade… uma paz… estava a transformar-se numa pessoa de direita! Fiquei tão feliz que tive vontade de chorar. Claro que a deixei ir.

O resto do fim-de-semana correu bastante bem. Descobri uma bomba da Repsol nas imediações do hotel e comprei vinho para a minha vinoterapia. Enquanto bebia e via tv por cabo na cama gigante, tentando não gastar dinheiro sem querer, pensei em tudo aquilo, em toda aquela experiência científica. Também me estava a transformar numa pessoa mais de esquerda porque estava a ficar mais pobre ao ritmo de um accionista do BCP. Creio que o resultado final foi positivo. Um dia, com isto de me chegar um pouco mais para a esquerda e a Plaft um pouco mais para a direita, encontramo-nos no centro, o meu objectivo. Aí filiamo-nos os dois no CDS.

12 comentários:

Anónimo disse...

Mmmmaravilhoso!

Anónimo disse...

Fantástico, parabéns!

Anónimo disse...

Venho aqui todos os dias à espera do momento em que alguém enfia a cabeça no forno, ou será que é para evitar enfiar a cabeça no forno? Faço muita confusão com nomes e coisas... a tua escrita inteligente/aparvalhada/profundamente realista rejuvenesce-me. Digo isto de coração, que eu valorizo muito tudo aquilo que me faz bem à pele.
Beijinhos à Plath
A

D.S. disse...

Vou começar a olhar para spas de toda uma outra maneira. Muito bom texto, sim senhor

Tiago disse...

não sabia que "chauffage" se escrevia "chauffage". tá boa! qdo é que me convidas para ir a tua casa? depois queixa-te que n vais ao casório... lol

Tolan disse...

Foi o spell check que me corrigiu isso, eu tinha chaufagem (que presumo que esteja errado). Gostava muito de ir ao casório, eu gosto muito de casórios, por incrível que pareça. É preciso convidar-te para vires a minha casa é? E trazias vinho?

Anónimo disse...

É pá, admito a licença artística, mas nunca na vida poderias tirar o guito do PPR. É proibido, a não ser que tenhas uma doença daquelas que te pôe em dúvida a própria possibilidade de chegar à reforma ou que estejas no desemprego há cinco anos, ou coisa que o valha.
É fodido ir delizando com a idade para o centro.
Bitaites

Palmier Encoberto disse...

Escorrem-me lágrimas...

Tiago disse...

Levava vinho e um CryBaby que tenho guardado com muito carinho... ah e a noiva tb!

Carla R. disse...

O amor é muito bonito ! Agora sim, tenho a certeza que a Plaft está em boas mãos e que desta vez tudo vai correr bem.
(Já a conclusão poderia ser mais ousada, Portugal não aguenta mais ninguém a enveredar por essa via).

tata disse...

Estou que não me aguento!!! Tu a caires para a esquerda, a plaft a lambuizar-se de direita numa descrição absolutamente hilariante!

Beatrix Kiddo disse...

Ela queria o banho de chocolate. Disse-me o preço e eu comecei a fazer contas mentalmente, com o volume cúbico da minha banheira e embalagens de nutela

hehehe que imagem